08/08/2014
Jovens meninos que se tornaram grandes pais
08/08/2014
Por: Eliane Muiniki
Passar de uma fase para outra sem uma preparação, assumir uma responsabilidade quando ainda nem era responsável por si. Isso acontece com muitos adolescentes e jovens que se tornam pais e precisam assumir, criar, educar e cuidar de uma criança, sem que esse papel social estivesse em seus planos.
Ser pai é assumir um compromisso único para toda a vida, porém nem sempre quando essa notícia chega é aceita de imediato. Depende muito da história familiar de cada jovem, e da rede de apoio que irá ajudá-lo a enfrentar essa nova realidade, é o que explica a psicóloga clínica Odiceles Cristina Antunes, com especialidade em terapia familiar e casal. “A paternidade pode ser encarada como uma tarefa fácil para alguns jovens adolescentes que aceitam essa nova etapa de suas vidas, já para aqueles jovens que não querem deixar de lado sua vida social e se recusam a assumir suas responsabilidades, não colaborando com o sustento do filho, o pai adolescente passa a desempenhar simultaneamente dois papeis sociais aparentemente contraditórios: ser adolescente e ser pai”, explica.
Foi o que aconteceu com Jorge Luis Ferreira de Lima (35), que foi pai aos 17 anos de idade. “Eu estava trabalhando e estudando, mas o que eu ganhava não era suficiente para sustentar uma família e não tinha nenhuma estrutura para assumir um compromisso de muita responsabilidade”. Quando ele soube, disse que ficou sem chão, demorou para “cair a ficha” e diz que foi bem complicado, pois a maior consequência é a responsabilidade que precisa ser assumida.
Situação semelhante aconteceu com Damodara Dec Calvin (26). A aceitação não foi imediata, pois sabia da responsabilidade que deveria assumir a partir de então. Num dia chuvoso de muito frio foi que ele descobriu que ia ser pai, em seus plenos 21 anos e de primeira mão recebeu logo a informação do médico que atendeu sua namorada (hoje esposa) Dalila de Castro Sousa (24), que poderiam ser gêmeos e já estava no sexto mês de gestação. Depois de três dias já descobriram o sexo do bebê. “Foi um desespero, é uma sensação horrível, devido à situação que não se sabe o que fazer, um susto muito grande, porque já estava em cima da hora e sem tratamento de pré-natal, nada. O dinheiro que eu ganhava aonde eu trabalhava não dava pra sustentar uma família”.
A psicóloga explica o porquê isso acontece. Segundo ela, “a adolescência por si só é uma fase bastante complexa, é um momento cheio de mudanças. O jovem ainda não tem algumas habilidades necessárias para exercer a paternidade. Relação instável, medo, insegurança financeira e impulsividade própria da adolescência também contribuem para não aceitação”. Mas Damodara afirma que foi uma sensação estranha momentânea, depois tudo vai estabilizando aos poucos, vai se normalizando e de imediato a sua primeira atitude foi mudar de vida por completo. “Eu tinha um carro e tive que repassar pra minha mãe, pois não teria mais condições para assumir os gastos, logo pensei em me mudar, pois eu morava e trabalhava em Curitiba, resolvi então vir para Campo Largo e morar com a Dalila. Já comecei a mandar currículo na cidade e por sorte consegui um serviço rápido aqui, tomei atitudes que eu nem antes imaginava. Antes eu não tinha responsabilidades. Eu trabalhava hoje pra gastar amanhã, não pensava muito na vida, não tinha muita obrigação, mas sempre eu tive no pensamento que se um dia eu fosse pai, eu ia ser um ótimo pai e quando fui nunca pensei em desistir”, complementa.
Mudanças com a paternidade
A paternidade na juventude pode afetar a vida, provocando alterações. Odiceles explica que “o jovem está habituado à dependência dos pais e o surgimento de um filho traz inúmeras obrigações e responsabilidades. Para quem tem a vida focada somente em escola, amigos, jogos, academia, a partir desta notícia, da paternidade, surgem responsabilidades como alimentação, roupas, remédio, plano de saúde etc. Por outro lado, se esse jovem aceitar a notícia de forma positiva, poderá usufruir da paternidade precoce formando uma nova família, com maior chance de ingressar no mercado profissional”.
Ao assumir esse papel tão extraordinário, é preciso muitas vezes abrir mão de muita coisa, no caso dos jovens principalmente. “Traz muitas mudanças, muda o teu modo de ver o mundo, medo de morrer, muda a atitude pessoal, muda o ciclo de amizades. Deixei meus amigos, minha família, minha casa, meu antigo emprego. Deixei tudo para trás. Cria-se então, uma nova rotina, a gente começa a se dedicar mais ao outro e passa a olhar menos para você mesmo. Preparar a mamadeira, trocar fralda, dar banho, acordar à noite foi o que sempre eu fiz. Sempre ajudei em tudo o que precisasse, me tornei mais caseiro. Cresceu mais a minha personalidade, amadureci muito”.
Segundo Jorge, ao se tornar pai, o homem passa a viver em função de seus filhos. Apesar de ter sido com 17 anos, Jorge diz que passar por tudo isso valeu muito a pena. “A experiência e o processo de criar e educar é maravilhoso, mas não é fácil, é preciso ter consciência. Saber que nossos filhos dependem e seguem os nossos exemplos fazem que o amadurecimento seja imediato e prazeroso”. Para ele, ser pai é “dar continuidade à própria vida, tentar formar pessoas para um mundo mais humano”.
Pra que isso , pai e filho precisam ter uma ligação comum um com o outro e também no envolvimento com toda a família de modo geral. A psicóloga detalha que vários especialistas defendem que a quebra do vínculo afetivo com o pai pode gerar sentimentos de abandono e de rejeição por parte da criança, que poderão repercutir nas relações por ela desenvolvidas no futuro, comprometendo a formação de novos vínculos. “Na prática do meu trabalho, percebo que o pai é uma referência e modelo para formar a identidade do filho, mas essa referência não se dá somente na figura paterna, mas também em familiares próximos, e até mesmo a mãe desenvolve esse papel quando impõe regras e limites na educação do filho”, completa.
Além de se tornar referência para os filhos, ser pai na juventude é também tirar lições para a própria vida. “De lição para mim, fica o amor e que apesar das dificuldades e dos contratempos da vida, se o amor persistir tudo vale a pena. Os meus filhos representam o maior tesouro que um homem pode ter. Amo meus filhos Jessica, Jorge e Jhonanthan”, declara Jorge.
Para Damodara, mesmo depois de muito susto, tudo valeu muito a pena, “a minha vida mudou pra melhor, porque por me tornar pai cresci na carreira profissional, hoje tenho minha própria empresa, a Calvin Tec e assim também foi na vida pessoal”. “Ser Pai é ensinar o melhor, se doar totalmente, estar pronto para o que precisar, é ser uma inspiração. A melhor frase seria: ser um herói para o seu filho. A Daniela é, para mim, a mais maravilhosa, mais lindinha, fofinha, inteligente, amável, tudo o que é de melhor, foi com ela que aprendi a melhorar cada vez mais, aprendi a observar como o crescimento funciona, aprendi que é preciso corrigir para se educar”, finaliza.