05/11/2013
Mulheres se capacitam para atuar em áreas 'dominadas' pelos homens
05/11/2013
Fonte:G1.com
Foto:Arquivo Pessoal
Atentas e de olho nas oportunidades de emprego, algumas mulheres procuram se qualificar para atuar ainda mais no mercado de trabalho. De acordo com a Relação Anual de Informações Sociais (Rais), divulgada pelo Ministério do Trabalho, em outubro deste ano, a participação delas no mercado de trabalho cresceu mais do que a dos homens em 2012. O crescimento foi de 3,89%. Já a participação masculina avançou 1,46%. Com isso, as mulheres passaram a representar 42,47% da força de trabalho no país.
O crescimento avança a ponto das mulheres começarem a se preparar para atuar, inclusive, em áreas até pouco tempo consideradas de domínio masculino. A prova é o aumento do número de alunas em cursos de qualificação profissional voltados para a construção civil e também mecânica industrial.
A coordenadora de Eixo de Estratégia e Ação do Senai Paraná, Estela Pereira, afirma que em 2009, por exemplo, o público feminino representava 23% das matrículas nos diversos cursos de qualificação oferecido pela entidade. Neste ano, segundo ela, o percentual passou para 39%. Ao todo, o Senai tem 55 mil vagas espalhadas pelo estado.
Pereira destaca que, no ramo da construção civil, as empresas têm valorizado as profissionais. “O que se observa, tanto professores quanto a indústria, é que na hora de contratar mulheres, é a questão da atenção, do detalhe. A mulher é muito detalhista”, explicou.
Essa predileção chamou a atenção da jovem Ada Fabiola dos Santos, de 17 anos. Ela fez dois cursos de soldagem e agora conquistou uma bolsa de estudos para realizar o curso técnico de metalurgia, com duração de dois anos. “Na época, eu não tinha noção do que era a solda. Comecei a ir às aulas e comecei a gostar. Logo, o professor me convidou para participar das atividades e hoje eu me vejo trabalhando nesta área”, contou adolescente.
No início, como qualquer novidade, acrescentou a estudante, houve dificuldades. “Mas eu fui superando e acabei gostando. Se você gosta do que você faz acaba não existindo mais a dificuldade”.
Ada lembrou que no primeiro curso de soldagem não havia muitas mulheres, porém, no segundo ao número já era maior. A adolescente tem planejado a vida profissional e procurado saber qual mercado de trabalho deve encarar quando concluir os estudos. Ela duvida que futuramente precise lidar com preconceito. “A mulher tem sido bastante valorizada. Hoje, eu percebo que as empresas até preferem mulheres, dizem que são mais cuidadosas e mais perfeccionistas”, explicou. Ada disse também que é uma área em crescimento, com relativa oferta de vagas de emprego.
Tania Regina de Jesus, de 31 anos, fez o curso de mecânica básica para se sentir mais capacitada para o trabalho, ministrado pelo Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Curitiba. Ela contou que o antigo emprego, no setor de montagem de chicote elétrico para caminhões, a surpreendeu pela quantidade de mulheres. “Eu fiquei surpresa. É a parte do chassi do caminhão, é uma parte pesada, muito braçal. Eu achava que para a montagem de chicote ia ter mais homens, mas não”.
“Explicaram para mim [que é uma área] que tinha que prestar mais atenção porque eram muitos detalhes, que para os homens passam despercebidos. As mulheres são mais minuciosas e o negócio tinha que estar 100% para passar pelo teste de qualidade”, explicou.
Tania decidiu fazer o curso de mecânica básica para se qualificar ainda mais na área que atuava. Ela conta que os ensinamentos foram de extrema importância e a fizeram gostar ainda mais da profissão. Agora, desempregada, Tânia espera conseguir rapidamente uma recolocação no mercado de trabalho. “Eu quero trabalhar em alguma empresa similar, porque tenho experiência e gosto”.
Empresas estão satisfeitas com mulheres nos canteiros de obra
A empresa FMM Engenharia, que fica em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, já incorporou as mulheres nas obras que realiza. Atualmente, são 63 trabalhadoras, que representam 17,59% dos funcionários dos canteiros de obra.
O responsável pelas contratações, Gustavo Tetto, diz que a mão de obra feminina é empregada na fase de acabamento da obra. Segundo ele, elas são mais caprichosas e valorizam os detalhes. “Também temos mulheres trabalhando nos almoxarifados, devido à responsabilidade e organização”, acrescentou.
Tetto explica que as contratações aumentaram a partir de 2010, quando houve um aquecimento do mercado e as empresas passaram a ter dificuldade para conseguir profissionais. Para ele, o resultado é exemplar. “O resultado tem sido muito satisfatório e a prova disso é que, mesmo com a atual estabilidade do setor, esta mão de obra continua sendo muito utilizada”.
Se por um aspecto a falta de profissionais abriu as portas para as mulheres atuarem em outras áreas, uma vez contratadas, elas tiveram que se adaptar ao ambiente masculino. Tetto lembra que a fase de inicial teve como característica uma leve resistências dos funcionários homens. “É normal que as mudanças tenham resistência, principalmente, em um ambiente predominantemente masculino. Mas elas ganharam espaço e a confiança de todos através dos resultados. Para facilitar a adaptação também é muito importante a postura da administração da empresa e obra, demonstrando respeito, e evidenciando que não há diferenciação e todos têm os mesmos direitos e deveres”, destacou.
Essa é uma tendência sem volta e com potencial para expandir para os demais setores econômicos, segundo Tetto. “É uma disputa saudável onde o resultado é a evolução e melhoria de nossa mão de obra em busca de espaço no mercado de trabalho”.
A professora Benilde Maria Lenzi Mortim, do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Paraná (UFPR), complementa ao citar que a questão da formação também contribui para que as mulheres conquistem novos espaços no mercado de trabalho. “A formação, sendo maior, a mulher tem abertura para entender a sua condição geral e saber que também pode disputar e ingressar em outras áreas. Elas estão participando mais em várias instâncias”, disse a professora. Mortin destaca ainda que a escolarização faz com que as trabalhadoras se deem a oportunidade de avaliar quais empregos desejam.
Logicamente, destacou a professora, isso acaba sendo mais comum em economias em fase de expansão. Aqui, novamente, a qualificação acaba contribuindo já que, em média, as mulheres têm mais anos de estudo e isso acaba sendo um diferencial no momento da contratação.
Remuneração não acompanha crescimento
Apesar do avanço das mulheres no mercado de trabalho, a questão salarial, em média, não registra a mesma ascensão. Conforme o Rais, enquanto a remuneração dos trabalhadores aumentou 3,35% em 2012, a das trabalhadoras cresceu 2,62%. Em média, os homens receberam R$ 2.250,40, e as mulheres R$ 1.850,26.
A professora Mortim, menciona aspectos que devem ser levados em consideração. Segundo ela, ainda que as mulheres tenham desbravado nichos e avançado no mercado de trabalho, não é possível desconsiderar completamente que elas passem por preconceito. Isso reflete, segundo a docente, ao longo da carreira.
“Elas não são cogitadas para cargos, promoções, supervisões. Acaba havendo a discriminação, porque existe a ideia de que ela vai ter problema para assumir cargos por questões da vida privada, há um julgamento prévio de indisponibilidade”.
Além disso, as mulheres acabam atuando mais nos setores de "cuidados" como enfermagem. “A enfermeira ganha menos do que o médico. Trabalham com faxina, no chão de fábrica, e esses cargos são menos remunerados. Elas acabam ganhando menos”. De qualquer forma, a professora avalia que as mulheres têm, aos poucos, se reconhecendo e estão abrindo caminhos. “Já se caminhou bastante”, finalizou.