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Delegacias

23-05-2011

Delegacias interditadas no Paraná seguem recebendo condenados

Delegacias

23-05-2011 Fonte Paraná Online

Quase um ano após a publicação em 21 de junho de 2010 do relatório do Mutirão Carcerário realizado no Paraná sob a coordenação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a realidade das carceragens das delegacias do Estado pouco mudou. Elas continuam com problemas de superlotação e funcionamento precário. E ainda: as carceragens das delegacias interditadas ou parcialmente interditadas pela Justiça continuam a receber presos. Atualmente 11 carceragens estão interditadas e nove parcialmente interditadas no Paraná.

A interdição das carceragens é uma decisão da Justiça, que proibe o funcionamento delas em função da superlotação, precariedade ou outros motivos. Carceragem parcialmente interditada é quando a Justiça limita o número de presos nas celas das delegacias.

"As delegacias da capital continuam recebendo presos porque na Polícia Civil o delegado fica entre a cruz e a espada, pois tem que colocar o preso em algum lugar", reconhece o delegado-chefe da Divisão Policial da Capital, Valmir Soccio. "Preso não deveria estar com a Polícia Civil. Deveria estar com a Secretaria de Estado da Justiça. Como houve distorção ao longo dos anos foi aumentando o número de presos e não tem vagas no sistema penitenciário para todos os presos", acrescenta o delegado.

Segundo Soccio, essa situação inviabiliza a atividade da Polícia Civil de investigar crime. "O policial que deveria investigar o crime tem que cuidar para que o preso não fuja e manter uma logística para mantê-lo na carceragem", afirma Soccio.

Os distritos policiais da capital recebem em média nove presos por dia. No início do ano recebiam em média sete por dia. Em contrapartida, saem dos distritos policiais em média cinco presos por dia para o Centro de Triagem II da Polícia Civil. Segundo Soccio, nos últimos meses a média da população carcerária nos distritos de Curitiba tem sido de 400 a 420 presos.

Em Curitiba, estão interditados o 5º Distrito Policial (DP), 6º DP, 11º DP, 12º DP e a Delegacia de Furtos e Roubos. O 9º DP está parcialmente interditado. Até o início da segunda semana de maio, o 9º DP tinha 66 mulheres presas sendo que o limite é de 16.

O delegado-chefe da Divisão Policial do Interior, Júlio Reis, afirma que as carceragens interditadas ou parcialmente interditadas continuam a receber presos porque a polícia tem como deixar de autuar em flagrante, senão gera insegurança nas cidades.

No interior do Paraná há 209 delegacias, sendo que 168 delas tinham cerca de 10 mil presos até o início da segunda semana de maio. As carceragens parcialmente interditadas no interior ficam em Paranaguá, Lapa, São João do Triunfo, Foz do Iguaçu, Cruzeiro do Oeste, Arapongas e Ponta Grossa. As carceragens interditadas no interior ficam em Sarandi, Maringá, Mangueirinha, Londrina (2º DP) e Ivaiporã.

Com exceção da delegacia de São João do Triunfo, essas carceragens e as outras da capital e região metropolitana continuam recebendo presos conforme informação da vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Paraná, Isabel Kugler Mendes.

"Lamentavelmente nada mudou. De todas as delegacias interditadas a que realmente está interditada é a de São João do Triunfo. Existe uma inércia. A imprensa tem divulgado que o governo está investindo mais em segurança, mas até agora não foi possível perceber onde estão sendo feitos esses investimento porque as carceragens continuam superlotadas e em estado precaríssimo", lamenta Isabel.

Ela cita como exemplo o 12º Distrito Policial de Curitiba que no início da segunda semana de maio tinha em média 150 presos sendo que sua capacidade é para 28. "Em Paranaguá é um caso de polícia. A carceragem da delegacia tem capacidade para 28 presos e nunca tem menos de 200. E continua o mesmo número de funcionários. Há precariedade nas instalações, de funcionários, na parte de saúde, em tudo", dispara Isabel.

Para o delegado divisional da Região Metropolitana de Curitiba (RMC), Hamilton da Paz, deixar o preso em delegacia é prejudicial à ressocialização do detento porque ele não tem uma ocupação, acompanhamento psicológico ou uma profissionalização. "É um problema do Departamento Penitenciário da Secretaria de Estado da Justiça que não absorve esses presos por falta de vagas no sistema penitenciário. A Polícia Civil e a Polícia Militar têm que continuar efetuando prisões num trabalho de defesa da sociedade e da manutenção da ordem", avalia Paz.

No total, há 19 delegacias com carceragem na Região Metropolitana de Curitiba. Está interditada a carceragem da delegacia da Fazenda Rio Grande e parcialmente interditada a de Quatro Barras. Dos 823 presos existentes nas delegacias da RMC até o início da segunda semana de maio, 551 são excedentes, segundo Paz.

Ministério Público

O procurador de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Criminais do Júri e de Execuções Penais (Caop) do Ministério Público do Paraná, Ernani de Souza Cubas Junior, reconhece que as próprias delegacias de polícia que originalmente deveriam abrigar presos provisórios acabam também mantendo os presos já condenados que deveriam estar cumprindo pena no sistema penitenciário ou regime semiaberto.

"Isso causa um transtorno nas cadeias do Estado. A interdição é uma questão complexa. Se o promotor entra com uma ação civil pública, pedindo a interdição da cadeia, ele também vai proporcionar outro problema porque não tem onde colocar os presos provisórios", afirma Cubas.

Ele lembra que o Tribunal de Justiça do Paraná cassou este ano a interdição de uma delegacia porque não havia vagas no sistema penitenciário no período do episódio. O desembargador do TJ/PR, Miguel Kfouri Neto, suspendeu uma liminar em 25 de fevereiro deste ano com relação à interdição da carceragem da delegacia de São José dos Pinhais proferida pela juíza da 1ª Vara Criminal daquele município, Luciane Regina Martins de Paula. A liminar pedia a transferência imediata dos presos da carceragem da delegacia de São José dos Pinhais para unidades do Departamento Penitenciário do Paraná.

A alegação do desembargador foi de que o pedido de interdição era um ato político porque não havia como obrigar a Secretaria de Estado de Segurança Pública a remover presos para o sistema penitenciário que está sob a responsabilidade da Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania e nem como obrigar a Seju a receber presos devido à falta de vagas no sistema penitenciário.

O Ministério Público conseguiu transferir posteriormente, no início da segunda semana de maio, 12 dos 152 presos que havia na carceragem da delegacia de São José dos Pinhais para o sistema penitenciário.

De acordo com Cubas, o Ministério Público do Paraná por meio do Caop está em conversação com a Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania para que haja um aumento do número de vagas no sistema penitenciário, principalmente no regime semiaberto. "Aí a gente pode transferir os presos para a penitenciária", afirma Cubas.

Multa

Cubas explica que a penalidade pelo não cumprimento da decisão da ação civil pública é a multa. "Pelo que eu tenho conhecimento não existe a sentença de multa do Tribunal de Justiça aplicada contra o Estado do Paraná, obrigando-o a criar mais vagas no sistema penitenciário e proporcionar melhores condições para os presos na cadeia", afirma o coordenador do Caop.

Para ele há até pouca ação civil pública neste sentido, pela dificuldade de conseguir no Tribunal de Justiça a decisão de criar vagas no sistema penitenciário e melhorar as condições das carceragens.

Novas vagas

Segundo a Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania, dos 30 mil presos no Paraná pouco mais de 15 mil estão nas 24 penitenciárias do Paraná. Eles estão sob a responsabilidade da Seju. Os outros quase 15 mil encontram-se nas carceragens das delegacias de polícia, a cargo da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp). De acordo com a secretária da Justiça e da Cidadania do Paraná, Maria Tereza Uille Gomes, todos os presos do Paraná passarão a cargo da Seju, até o final deste governo. A Sesp ficará responsável pelo trabalho de policiamento, investigação e prisão.

Conforme a Seju, está prevista para o segundo semestre deste ano a criação de 2.500 novas vagas com a construção da Penitenciária Estadual de Cruzeiro do Oeste (720 vagas) e do Centro de Regime Semiaberto de Maringá (300 vagas) e a ampliação da Penitenciária Central do Estado (1480 vagas). São unidades penais que serão financiadas com recursos do governo do Paraná e do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen).

Segundo a Seju em breve devem entrar em processo de licitação novas unidades penais que abrirão 1.064 novas vagas: a Penitenciária para jovens e adultos entre 18 e 24 anos, a ser construída em Piraquara (800 vagas), com um investimento de R$ 14.700.000,00 do Ministério da Justiça e o restante do governo do Estado e a construção da Penitenciária Estadual de Regime Semiaberto de Ponta Grossa (264 vagas).

Ainda de acordo com a Seju está prevista a abertura de mais 2.426 novas vagas por meio de projetos que a Secretaria espera resposta do Ministério da Justiça: Penitenciária de Ponta Grossa (800 vagas), Penitenciária de regime semiaberto em Foz do Iguaçu (480 vagas), Penitenciária de regime semiaberto em Francisco Beltrão (336 vagas), Penitenciária de regime semiaberto em Piraquara (480 vagas) e Colônia Penal Agrícola, em Londrina (330 vagas).

Novas unidades

Ainda segundo a Seju, está em fase de conclusão um estudo para prever a necessidade de novas unidades para os próximos anos no Paraná. Esse estudo depende também de outras ações que estão sendo implementadas. "Estamos fazendo um estudo rigoroso e um levantamento sério em todo o sistema prisional paranaense para identificar as condições de prisão e a situação de cada pessoa presa nas penitenciárias do Estado", afirma Maria Tereza.

"Nossa meta é construir Cadeias Públicas Regionais, em todas as grandes regiões do Estado, para que os presos cumpram pena próximo de onde moram. Assim eles podem receber formação profissional de acordo com as necessidades das próprias regiões, o que facilitará sua reinserção social", afirma a secretária.