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Reconstruir a família

Reconstruir a família

02-12-2010

Toda família deve possuir um sentido de missão e contribuir efetivamente para a construção da sociedade

Paulo Sertek

As questões ambientais estão se tornando cada vez mais importantes e temos de nos acostumar a pensar em termos de desenvolvimento sustentável. Isso significa atuar pensando no nosso futuro comum, porquanto teremos de compartilhar o meio ambiente e deixá-lo como herança para as próximas gerações. Convém, pois, pensar em termos de uma ética do cuidado e da responsabilidade, o que leva a cuidar do mundo que nos cerca no dia de hoje, para que haja um futuro possível para as novas gerações.

O que nos chama a atenção é o pouco destaque que se dá à sustentabilidade do hábitat natural do ser humano, que é o seu núcleo familiar. Preocupamo-nos com a possível extinção de alguns animais, com os ninhos das aves, com a preservação do mico-leão-dourado. Esquecemos, porém, que o ser humano, sendo o mais frágil dos seres deste planeta, necessita que lhe asseguremos um futuro estável para o seu desenvolvimento pleno com os cuidados maternos e paternos.

A família está sofrendo de uma patologia de desagregação continuada que se estende a todos os estratos sociais. Os nossos colegas pesquisadores e também as educadoras estão recorrentemente lidando com as consequências deste fenômeno. A desagregação ou desestruturação familiar tem levado, na maioria dos casos, a uma parentalidade ineficiente ou até nociva para as crianças. Constatamos, a partir dos depoimentos das educadoras, o déficit crescente de atenção dos pais aos seus filhos por excesso de horas de trabalho e ainda somam-se as dificuldades provenientes das separações, gravidezes na adolescência, violência familiar etc.

A questão que se impõe aos governantes, educadores, pais e mães e à sociedade em geral é sobre: "o que estamos fazendo pelo desenvolvimento sustentável da família?" Em outras palavras: "estamos preparando as novas gerações para serem capazes de construir futuras famílias fundadas em valores éticos?" Com o adjetivo sustentável queremos significar aquela capacidade de gerar famílias através das próximas gerações com os valores que hoje prezamos, como o respeito, a confiança, o comprometimento, a responsabilidade, o cuidado do meio ambiente.

Identificamos atualmente a existência de múltiplos fatores de desconstrução da família que se propagam na nossa sociedade quase que imperceptivelmente. Que forças desconstrutivas são essas? Penso que são a ausência de ideais, a ausência de compromissos e a mentalidade de curto prazo. Reconhecemos a ausência de ideais pela falta de capacidade de assimilar as dificuldades. Reconhecemos a ausência de compromissos pelo número crescente de uniões efêmeras e voláteis, porquanto as pessoas já não compartilham seriamente projetos e futuro. Reconhecemos a mentalidade de curto prazo pelas relações entre cônjuges serem mais fundadas no tangível havendo ausência do compartilhamento de valores intangíveis como o amor e a compreensão nas dificuldades; na verdade faltam os valores que representam o que é genuinamente humano: a sua espiritualidade.

A reconstrução da família, visando ao nosso futuro comum, passa necessariamente pelo fortalecimento dos vínculos de amor e doação como a maneira mais natural e mais eficaz de acolher as crianças, prepará-las para a vida e dar-lhes afeto e segurança. A família, assim constituída, propicia os fundamentos da sociabilização que garante a assimilação dos valores éticos e potencializa a sua difusão de geração em geração.

A realidade dos fatos comprova que as famílias que compartilham os valores intangíveis, como o da formação espiritual dos filhos, são as que as educam para a vida e para a construção de um futuro sustentável. Por outro lado, nas quais os vínculos familiares são frágeis e efêmeros, nas quais há o predomínio da mentalidade de curto prazo e carência de valores morais, é onde se dão as piores condições para a educação dos filhos.

Para deixarmos às próximas gerações as condições de sustentabilidade familiar é necessário desde já reconstruir a família, e, por isso, convém que saibamos prezar e ensinar a praticar os ideais elevados. Toda família deve possuir um sentido de missão e contribuir efetivamente para a construção da sociedade. A missão é orientada pelos valores morais compartilhados por essa célula básica e somente com o crescimento do comprometimento e da confiança entre os cônjuges é que teremos as bases de uma sociedade mais segura e virtualmente sustentável.

Paulo Sertek é doutor em Educação pela UFPR e autor dos livros Responsabilidade Social e Competência Interpessoal; Empreendedorismo; e Administração e Planejamento Estratégico. E-mail paulo-sertek@uol.com.br