Foi realizada no início da tarde da última quarta-feira (14), por meio de live, uma audiência pública para tratar sobre os recursos da Lei Aldir Blanc em Campo Largo.
Foi realizada no início da tarde da última quarta-feira (14), por meio de live, uma audiência pública para tratar sobre os recursos da Lei Aldir Blanc em Campo Largo. Participaram da discussão a sociedade civil, membros do poder Executivo e Legislativo da cidade. De acordo com o divulgado na audiência pública, apenas 9,92% dos recursos vindos para a Campo Largo, na ordem de R$ 916 mil, foram utilizados.
Geslline Giovana Braga, do Coletivo Magnólias e doutora em Antropologia pela Universidade de São Paulo (USP), e atua na parte da produção cultural local, explicou que esta audiência foi necessária para discutir a baixa execução dos recursos da Lei Aldir Blanc no ano de 2020 em Campo Largo, quando ela acabou sendo sancionada. “Na ocasião, o Coletivo Magnólias, junto a artistas e produtores culturais de Campo Largo chegou a fazer um documento que foi encaminhado à Secretaria Municipal de Educação, Departamento de Cultura, que foi respondido, porém não acatado. Nele nós apontávamos as incorreções dos editais que se referem ao veto do auxílio emergencial para os artistas que tinham recebido, e o que tivemos foi este resultado: dos R$ 916 mil encaminhados para a cidade, apenas 9,92% foram executados. Isso quer dizer que Campo Largo está entre os municípios de baixa execução dos recursos da Lei Aldir Blanc.”
A representante segue explicando que este recurso não utilizado seria devolvido ao Governo Federal, caso não fosse prorrogada a Lei Aldir Blanc no ano de 2021.
Durante a live, a artista campo-larguense Jéssica Salles apresenta um histórico de editais que foram publicados em Campo Largo. “No município nós tivemos quatro editais. O primeiro que tratava sobre espaços culturais, iria contemplar 35 espaços, com valores de R$ 10, 15 a 20 mil, mas foram apenas dois espaços contemplados. O edital número dois, de Conteúdo Digital Artístico iria contemplar 71 obras, sendo apenas oito contempladas. O edital número três, que eram 30 oficinas inéditas, apenas cinco foram contempladas. O edital número quatro, que era de Vídeos Inéditos e propostas culturais que apresentassem aspectos da memória cultural de Campo Largo, sendo oito vídeos sobre a memória cultural de Campo Largo, 10 entrevistas, nenhum foi contemplado”, retrata.
Reivindicações sobre o edital
Um dos pontos levantados na discussão foram alguns impedimentos para que os artistas participassem como “servidores empregados públicos, vinculados à Prefeitura Municipal não poderiam participar dos editais”, membros do Conselho de Cultura e beneficiários de programas assistenciais, como Auxílio Emergencial. Por exemplo, se o artista tem um contrato com a Prefeitura, para uma oficina – ainda que suspenso em decorrência da pandemia – não poderia participar dos editais. Foi ressaltado na live que pessoas com estes contratos não recebem décimo terceiro, férias e outros benefícios, por exemplo, não sendo considerados funcionários do quadro fixo da Prefeitura.
Bruno Wozniack, que representou o Conselho de Cultura de Campo Largo, comentou ainda que houve situações onde os próprios conselheiros estavam em situações complicadas para tentar conseguir participar dos editais. “Há colegas meus, oficineiros ou conselheiros que realmente vestem a camisa, lutam pela Cultura, com medo que o recurso saia para eles e eles percam por estar nesta posição, embora estejam há um ano sem receber, para poder ter direito a receber um auxílio em um momento tão delicado que estamos vivendo”, disse. “Eles recebem só por horas de trabalho, conforme a licitação que participaram e precisam pagar por um alvará, para conseguir trabalhar, no valor de R$ 600 à vista. Além deles não poderem trabalhar virtualmente, por questões contratuais”, completou.
Jéssica Salles também apresenta questões como a necessidade dos vídeos serem inéditos, mas a problemática da falta de recursos da parte do artista em conseguir gravar primeiro e depois captar a verba e a situação de pandemia também agravou a situação, pois impossibilitava gravações. “É estranho um artista produzir um vídeo inédito, sendo que ele não tem dinheiro para bancar o vídeo ainda. Isso foi no edital do Município, pois eu fui contemplada no edital do Estado, pela Lei Aldir Blanc, e não havia exigência do vídeo ser inédito, sendo a mesma lei”, completa.
O secretário de Cultura Luiz Gustavo Torres disse durante a live que em reunião com a Procuradoria do Município foi repassado a ele que o edital foi feito de maneira a atender a Lei de Responsabilidade Fiscal e defende que deve ser investido na Cultura municipal. “Já encaminhamos o Projeto de Lei para o prefeito, para que possamos encaminhar até a Câmara dos Vereadores e então venha a desburocratizar o processo que envolve a Lei Aldir Blanc em Campo Largo. Além disso, teremos 142 bolsas de qualificação na cidade, em torno de R$ 3 mil por artista, que está no site da Prefeitura, disponível em link. Precisamos estar mais próximos para realizar da melhor maneira possível o próximo edital, a fim de abranger o maior número de artistas possível”, disse.
Geslline explica que neste momento é importante que os editais passem por uma consulta pública, para ampliar o diálogo com toda a população. “Com relação ao Auxílio Emergencial do Governo Federal, essa cláusula não estava na lei Aldir Blanc originalmente, pois ela prevê que essa verba seja usada como auxílio, mas não vetava o auxílio. Esse foi um problema de entendimento e compreensão da Lei, que dificultou o acesso aos editais”, completa.
Artistas merecem atenção
Ao longo da live, vários representantes falaram sobre o momento delicado pelo qual os artistas estão passando durante o período da pandemia. Everaldo Sant Anna, professor e autor profissional, evidenciou que este é um momento histórico de crise, tratando-se de uma questão de sobrevivência do ser humano. “Eu tenho contato com pessoas que estão tendo a iniciativa de pegar comida para artistas de circo, artesãos, pois o poder público de outras cidades está omisso. Como produzir cultura se você não tem almoço? Nós temos bairros que contam histórias e com recursos vindos para a mão de artistas, nós podemos aquecer a economia local”, contribui.
Adriano Petermann, primeiro secretário do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos e Diversões do Paraná, explicou que existe verba para a Cultura, mas o problema está na gestão. “Não estou culpabilizando somente as gestões, pois também é um problema da participação popular. Uma coisa neste um ano de pandemia e essa experiência no Sindicato que eu estou tendo, é que existem mecanismos constitucionais para nós, enquanto cidadãos, artistas e trabalhadores, tem como participar e ser ouvido, mas não estamos ocupando estes espaços. Nós descobrimos que o governo não sabe quem são seus artistas, então há uma falência na engrenagem para a distribuição deste dinheiro. É importante que os artistas se organizem como base, tornem tradição as eleições de cadeiras de conselheiros e fiscalize, cobre, ajude”, orientou o público que assistia a transmissão.
“Devemos dar oportunidade deste dinheiro como fomento. É muito comum nós vermos artistas mais antigos em Campo Largo, apesar de receberem homenagens, alimentarem um ressentimento por não conseguirem publicar seus livros, seus filmes. Este é o momento de prestigiarmos essas pessoas e aproveitar a vinda desta verba”, finaliza Geslline.