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Política

Supremo

05-05-2011

Supremo retoma nesta quinta-feira julgamento sobre união homoafetiva

Supremo

05-05-2011

O STF (Supremo Tribunal Federal) retoma nesta quinta-feira (5) o julgamento que discute a equiparação das relações homoafetivas às uniões estáveis tradicionais, entre homem e mulher. A sessão da quarta-feira (4) foi interrompida após o voto a favor do ministro Ayres Britto, relator dos processos.

Sem as manifestações de praxe em frente à Corte Suprema, os debates acabaram se resumindo ao plenário. De um lado estavam a PGR (Procuradoria-Geral da República), a AGU (Advocacia-Geral da União), o governo do Rio de Janeiro e 13 organizações de defesa dos homossexuais. Do outro, contra a união homoafetiva, a CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil) e a Associação Eduardo Banks.

O julgamento começou com a sustentação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, de que é direito fundamental de todas as pessoas de formular e perseguir seus planos de vida, desde que não implique na violação de direitos de terceiros.

- Quando o Estado se nega a reconhecer a união homoafetiva, ele instrumentaliza os homossexuais sacrificando seus direitos, priva os parceiros de uma série de direitos como alimentos, herança, previdência e aumenta o estigma, rebaixando-os à condição de segunda classe. Privar os cidadãos de direitos como esses fere a dignidade da pessoa.

Gurgel citou dados do Censo 2010, divulgados em abril, segundo o qual cerca de 60 mil brasileiros dizem morar com cônjuge do mesmo sexo. O número corresponde a 0,03% do total da população. Já 19,7% dos brasileiros afirmam morar com cônjuge de sexo diferente.

Representando o governo do Rio de Janeiro, que ajuizou uma das ações a favor da união homoafetiva, o advogado Luís Roberto Barroso subiu à tribuna para dizer que a história da civilização é a história da superação do preconceito.

- Hoje, duas pessoas que unem seu afeto estão numa sociedade de fato, como uma barraca na feira. A analogia que se faz está equivocada. Só o preconceito mais inconfessável deixará de reconhecer que a analogia correta é com a união estável. O contraditório ficou a cargo de Hugo José Cysneiros, advogado da CNBB. Para defender a tese de que a união homoafetiva seria contrária à Constituição, Cysneiros chegou a invocar que o artigo 226 do texto referia-se apenas à junção de homens e mulheres.

Em seu parágrafo terceiro, a lei afirma que "para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento."

- A falta da palavra "apenas" não pode significar que todo e qualquer tipo de união poderá ser contemplada. Quando a Constituição fala em homem e a mulher, não posso enxergar algo distinto de alguém do sexo masculino e alguém do sexo feminino. Aqui não são os perseguidos, oprimidos e massacrados contra os poderosos. Trata-se do que quis dizer o nosso legislador constituinte originário, e ele já disse tudo.

Voto

A sustentação do advogado da CNBB foi o mote para o início do voto do ministro Ayres Britto. Conhecido por suas longas intervenções, recheadas de citações filosóficas e poesia, o ministro iniciou rebatendo a suposta ausência da conjunção na lei.

- Se não estiver juridicamente proibido, está juridicamente permitido. Ausência de lei não é ausência de direito. Se não há lei que proíba, a conduta é lícita.

Ao longo de quase duas horas, Ayres Britto discorreu sobre análises biológicas e jurídicas até apresentar o ponto central de seu voto: o conceito de família independe de gênero.

- A família é a base da sociedade. Não é o casamento. É a família, núcleo doméstico, seja de heterossexuais ou de homossexuais. A Constituição não distingue gênero masculino e feminino, não faz distinção em relação a sexo. Logo, nem sobre orientação sexual. Não existe família pela metade, família de segunda classe. Casamento civil e união estável são distintos, mas os dois resultam na mesma coisa: a constituição de uma família. Não se pode alegar que os heteroafetivos perdem se os homoafetivos ganham.

Após a sessão, o ministro explicou que seu voto foi em sentido amplo e irrestrito. Isso significa que os direitos hoje concedidos a casais heterossexuais, como herança, previdência e adoção, poderão ser estendidos a casais homossexuais.

- Defendo que deve ser excluída da interpretação da regra qualquer significado que impeça o reconhecimento de pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

Ações

Estão em julgamento duas ações sobre o tema: uma encaminhada há mais de dois anos pelo governo do Rio de Janeiro, que pede que os casais homossexuais de servidores públicos tenham os mesmos direitos que os heterossexuais; e outra, de autoria da PGR (Procuradoria-Geral da União), que argumenta que o não reconhecimento dos direitos dos casais gays fere a Constituição Federal.

Na sessão que continua nesta quinta-feira, dez ministros ainda precisam se manifestar sobre os processos - Dias Toffoli está impedido por ter atuado como advogado-geral da União nas ações. Os votos de pelo menos três deles são esperados a favor da união homoafetiva. Gilmar Mendes, Cesar Peluzo e Celso de Mello já proferiram decisões nesse sentido.