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Mães acumulam ainda mais tarefas durante a pandemia

Divisão de tarefas e rede de apoio são essenciais para não gerar sobrecarga nas mães, explica psicóloga, que também fala como o excesso de atividades em uma só pessoa pode trazer prejuízos &agr

Mães acumulam ainda mais tarefas durante a pandemia

Não é segredo e pesquisas mostram que as mulheres estão mais sobrecarregadas durante a pandemia da Covid-19, que já dura mais de um ano. De acordo com a pesquisa feita pelo site Mulheres na Pandemia, pelo menos 50% das mulheres que participaram do levantamento passaram a cuidar de alguém, 41% afirmou que o trabalho aumentou. Ainda, de acordo com o IBGE, mais de sete milhões de mulheres precisaram deixar seus empregos, o que gera um grande desgaste e preocupações com o orçamento familiar.

De acordo com Angélica Santos Neris, psicóloga e Terapeuta Relacional Sistêmica e psicoterapeuta individual, de casais e famílias, a pandemia passou a escancarar uma realidade já vivida por milhares de mulheres.

“Sem escola pra colocar as crianças, sem ajudante para os serviços domésticos, quem precisou sair dos empregos foram as mães, quem precisou se ocupar da educação pedagógica também foram elas, na maioria das famílias. Não há duvidas que este contexto do qual estamos vivendo está levando as mães à exaustão e adoecimento mental.”

Ela explica que ainda há uma necessidade de desconstruir vários estereótipos, com cuidado para não criar novos. “Saímos, de certo ponto, do estereótipo do sexo frágil, da mulher que precisa ser protegida, e caímos no de mulher guerreira, que normaliza e até romantiza o sofrimento para se chegar a algum lugar/conquista. A mulher multitarefa é outro, cabe à mulher assumir tudo, porque e? ha?bil em conduzir va?rias coisas. ‘O homem faz uma coisa ou outra porque na?o tem essa habilidade’, diz o discurso há muitos anos e isso facilita para acumularmos os dois grandes campos de trabalho, profissional e do lar”, explica.

Ela segue explicando que essa grande demanda e necessidade em cumprir tarefas faz com que a mulher tenha jornadas triplas e até quádruplas diárias. Isso leva ao esgotamento e prejudica a saúde da mulher, gerando impacto na qualidade do sono, na vida sexual, geram ansiedade, podem se sentir deprimidas e constantemente exaustas.

 

Pandemia e puerpério

O puerpério, logo após a mulher ganhar bebê, é uma fase difícil para muitas mulheres, pelo aparecimento do baby blues e depressão pós-parto, por exemplo. Angélica explica que essas condições já atingiam mulheres antes de surgir uma pandemia. “O que pode acontecer é que na pandemia o isolamento, a falta ou redução de rede de apoio, o medo de contágio, todo o contexto em si, torne esse período um duplo desafio. Alguns sentimentos que já estariam presentes nesta fase podem ficar mais agravados. O medo em cuidar e proteger o bebê, que já é comum na puérpera, pode ficar mais intenso, visto que há o risco de Covid-19, a solidão materna se intensifica devido ao isolamento”, explica.

 

Sobrecarga e cansaço

Angélica define a sobrecarga mental como a “tarefa invisível”, na qual cabe o planejamento e a organização, que antecedem o trabalho concreto. Aqui entra o planejamento do lar, organização do que e quando deve ser feito.

Já o cansaço mental, define a psicóloga, ocorre quando se ultrapassam os limites de atividades e informações e este excesso leva a sintomas físicos e mentais como: baixa do rendimento e desempenho no dia a dia, aumento da irritabilidade, sentimentos de tristeza, angústia e desânimo ficam mais presentes, alteração do sono, dificuldade em manter o foco, dores no corpo, cabeça ou aparecimento de problemas gastrointestinais. Também podem incluir constantes explosões, irritação frequente, impaciência. Trazem prejuízos nas relações e, por vezes, sinalizam a necessidade em buscar ajuda.

“A busca por ajuda profissional pode acontecer antes do aparecimento de sintomas, sejam eles físicos, mentais ou relacionais. Uma saída coletiva seria pensarmos em novos pactos sociais mais igualita?rios de homens e mulheres para aprenderem a lidar com as questo?es da vida adulta. Uma saída individual é não tornar a tripla jornada um estilo de vida, nem se propor a dar conta de tudo”, recomenda.

 

Sem culpa para um tempo livre

O sentimento de culpa pode acompanhar muitas mães, especialmente as multitarefas e, para muitas, encontrar um tempo livre, para cuidar de si mesma, parece até uma utopia. “Este tempo aos poucos precisa ser criado. Ele não acontecerá sem esforço. O parceiro, as pessoas próximas, nem sempre te lembrarão disso ou te darão condições para fazê-lo, talvez o façam para você sair trabalhar, mas não ficarão com as crianças para que você tenha um tempo para você, para um hobby, lazer, terapia ou ócio. Não podemos esquecer que mãe também é mulher, e embora a sociedade eduque para ser ou mãe ou mulher, como se fosse oposição, isso não acontece”, recomenda.

Neste contexto, mesmo as crianças podem ajudar na divisão de tarefas e criar mais tempo livre com suas mães para tarefas diferentes. “Para se construir um espaço familiar saudável, em que as tarefas domésticas não caiam sobre os ombros de uma única pessoa, é importante ensinar e educar as crianças com objetivo de desenvolver nelas autonomia. Por isso, cabe educá-las para que possam, de acordo com sua capacidade, cuidar de coisas da casa, sempre com supervisão dos pais e aprimoramento”, diz.

Além disso, a divisão pode ser feita através da terceirização do serviço doméstico, passando-o para uma profissional ou para alguém da família que seria uma rede de apoio.