Objetivo é disseminar no mercado a viabilidade de aços de alta resistência como alternativa ao aço carbono, que é menos resistente à corrosão.
Uma pesquisa desenvolvida na Universidade Estadual de Maringá (UEM) propõe o uso do nióbio em diferentes tipos de edificações, como pontes, viadutos e obras da construção civil. Esse elemento químico consiste num metal flexível e maleável com capacidade de aumentar em aproximadamente 60% a resistência e durabilidade do aço, sem acréscimo significativo no peso da liga metálica. Considerado valioso, devido a propriedades únicas para aplicações industriais, o mineral está presente na produção de aços especiais usados em uma variedade de produtos, desde oleodutos até peças de aeronaves.
O objetivo do projeto da UEM é disseminar no mercado a viabilidade de aços de alta resistência como alternativa ao aço carbono, que é menos resistente à corrosão e ainda muito utilizado em estruturas da construção civil, em componentes da indústria automotiva, em equipamentos industriais e na fabricação de utensílios e ferramentas (facas e serras). A ideia é comercializar, no futuro, estruturas de construção pré-fabricadas com o nióbio, que além de mais leves, são produzidas com redução de resíduos.
O coordenador do projeto, professor Carlos Humberto Martins, do Departamento de Engenharia Civil da UEM, destaca a importância da construção civil na economia brasileira. “O setor da construção civil é um dos que mais consome recursos naturais, de forma que demanda inovação e sustentabilidade, como o uso do nióbio em estruturas metálicas, pois o uso desse mineral no aço possibilita construções mais eficientes, mais resistentes e duráveis e, principalmente, mais sustentáveis”, afirma.
O estudo científico realizado na instituição de ensino superior pertencente ao Governo do Paraná começou em 2023, e conta com um financiamento de R$ 1,33 milhão, por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Os recursos são destinados para o custeio de bolsas-auxílio para os pesquisadores, licenças de softwares, serviços de terceiros e equipamentos que serão doados para a universidade ao final do projeto. De acordo com o cronograma de experimentos, as análises seguem até abril de 2025.
Para a realização de testes com vigas em tamanho real, a equipe de pesquisadores contou com o apoio da Gerdau, multinacional brasileira produtora de aço e uma das principais fornecedoras de aços longos nas Américas e de aços especiais no mundo. A empresa disponibilizou quatro vigas com aço de grau 50 e aço de grau 60 para os ensaios em laboratório.
Outros testes estão em desenvolvimento com vigas casteladas, um tipo específico de viga de aço caracterizado por aberturas hexagonais no perfil de metal. Essas vigas usam menos material, ficam mais leves e, ainda assim, permitem mais resistência.
RESULTADOS – Na prática, a adição de nióbio ao aço aumenta a resistência à corrosão e amplia a capacidade de suportar cargas sem muita deformação, processo chamado de resistência mecânica. Os resultados preliminares do projeto da UEM comprovam que o material de aço de grau 60 é significativamente mais resistente que o aço de grau 50, usado geralmente em construções. A inclusão de cerca de 0,05% de nióbio na composição do aço G50, por exemplo, é suficiente para melhorar a qualidade do produto.
O estudante de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Vinicius Brother dos Santos, ressalta a importância de soluções econômicas para o setor da construção.
“Essa pesquisa busca soluções inovadoras para o setor da construção com a aplicação prática em estruturas de aço e estruturas mistas de aço e concreto nas obras de infraestrutura. A adição de nióbio às ligas metálicas faz com que as estruturas de aço tenham as propriedades de durabilidade melhoradas, reduzindo o impacto ambiental com eficiência econômica”, sinaliza.
CONCRETO – A equipe de pesquisadores também trabalha com um Concreto de Ultra-Alto Desempenho (UHPC, sigla em inglês para ultra-high performance concrete), um tipo avançado de concreto com propriedades superiores de durabilidade em relação ao concreto convencional e caracterizado por uma baixa permeabilidade. “Ao usar esse concreto, em vez de uma laje de 15 centímetros de altura, é possível construir uma laje com apenas 7 centímetros”, exemplifica o professor Carlos Martins.
Conforme o docente, a pesquisa pretende demonstrar que é possível construir dois viadutos com diferentes especificações. “Um dos viadutos utiliza aço G50 com concreto comum e pesa 20 toneladas, com uma previsão de vida útil de 50 anos, e o outro viaduto usa aço G60, que contém mais nióbio, em uma laje de Concreto de Ultra-Alto Desempenho e conectores de alta resistência”, afirma. “O segundo viaduto tem a mesma capacidade de carga do primeiro e pesa 17 toneladas, o que representa uma redução de 15% no peso, e uma vida útil estimada de 80 a 90 anos".
O grupo de pesquisa atua, ainda, com armaduras longitudinais, que consistem em estruturas formadas por barras de aço ou ferro, encaixadas em vigas, pilares e lajes de concreto. Para esse estágio da pesquisa, a Gerdau forneceu um vergalhão modelo GG 70, que é resistente e leve, devido à menor quantidade de aço.
Outra etapa da pesquisa envolve pinos conectores de cisalhamento, também conhecidos como pinos de cisalhamento ou pinos de transferência de cisalhamento. Cedidos pela empresa Ciser, uma indústria de Joinville, em Santa Catarina, esses dispositivos são semelhantes a parafusos e usados para conectar estruturas pré-fabricadas ou concreto armado, como as vigas e lajes de uma edificação. A pesquisa da UEM aponta que é possível reduzir a quantidade desses itens numa obra ao optar por conectores mais resistentes, o que também resulta em economia de tempo.
TECNOLOGIA – O projeto foi contemplado no ano passado com US$ 100 mil em créditos, que equivalem a R$ 549,6 mil na cotação atual, num programa para pesquisas da Amazon Web Services (AWS), uma plataforma de serviços de computação em nuvem da Amazon, multinacional de tecnologia norte-americana. Por meio de uma senha de acesso a computadores de alto desempenho, os créditos são usados pelos pesquisadores para processar as análises do estudo. Esses computadores estão localizados no condado de Arlington, no estado da Virginia, nos EUA.
Essa infraestrutura de tecnologia disponibiliza processadores ultra potentes, que possibilitam rodar os modelos das vigas do projeto com o nióbio em muito menos tempo. Ao utilizar um computador comum, por exemplo, os resultados podem demorar até oito horas. Esse tempo cai para uma hora, sem interrupção, ao usar os computadores em nuvem desse programa internacional.
PARCERIA – O projeto científico do nióbio é uma iniciativa do Grupo de Pesquisa em Análises Numéricas da UEM, que investiga as estruturas de aço e concreto em diferentes aspectos, como análises física e geométrica, materiais de alta resistência e inteligência artificial (IA). Entre os pesquisadores, estão dois alunos da graduação em projetos de iniciação científica tecnológica da UEM e nove estudantes de pós-graduação, sendo cinco de mestrado, três de doutorado e um de pós-doutorado.
O estudo do nióbio em edificações conta, ainda, com a participação de seis pesquisadores das universidades federais de Uberlândia (UFU) e de Juiz de Fora (UFJF), ambas de Minas Gerais; da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e da Universidade Mackenzie de São Paulo.
Na próxima etapa da pesquisa serão coletados os resultados dos testes de aceleração do processo de corrosão do aço G50 e do aço G60 com a utilização de spray de sal e umidade, realizados nas câmaras de névoa salina da PUC-RJ. As pré-avaliações apontam que o aço G60 é muito mais resistente à degradação promovida pelas névoas salinas.
INOVA NIÓBIO – O estudo desenvolvido na UEM tem amparo no Programa Inova Nióbio, uma política pública nacional instituída em 2022 pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). O programa tem como objetivo integrar e fortalecer a cadeia produtiva do nióbio, a partir de pesquisas científicas para aplicação desse mineral em soluções inovadoras. A ideia é estimular a transferência de tecnologia e a cooperação estratégica entre governos, universidades e indústrias, com foco na geração de riquezas, trabalho, emprego, renda e crescimento econômico e social.
O Brasil detém cerca de 90% da produção global de nióbio, com reservas localizadas principalmente no estado de Minas Gerais, Amazonas e Goiás. Apesar das vantagens, alguns fatores impedem que o mineral seja aplicado na forma pura nas edificações. Ao mesmo tempo em que demonstra alta capacidade de resistência, o nióbio é muito suscetível à deformação, o que implica na necessidade de ser misturado com o aço, para fornecer uma estrutura mais rígida e, por consequência, mais estável para as construções.
Além disso, esse metal ainda é caro, com o preço do quilo em torno de 50 dólares, equivalente a cerca de R$ 275, na cotação atual.
SUSTENTABILIDADE – A partir dessa pesquisa da UEM, a ideia é que os alicerces e as estruturas prediais sejam fabricados num local e depois deslocados para a montagem nos canteiros das obras. Desse modo, será possível reduzir o uso de materiais na produção, com menos emissão de dióxido de carbono (CO2), composto químico gasoso conhecido como gás carbônico, e que tem influência direta no efeito estufa e nos desequilíbrios climáticos do planeta.
Essa forma de uso racional de recursos está alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), mais especificamente ao ODS 9 (Indústria, Inovação e Infraestrutura), que busca promover a modernização industrial e as tecnologias limpas para assegurar o crescimento econômico sem comprometer a sustentabilidade ambiental. O Estado do Paraná está comprometido em implementar ações para alcançar essa meta global, focando na industrialização sustentável e no fomento à inovação, para impulsionar o desenvolvimento socioeconômico e melhorar, cada vez mais, a qualidade de vida da população.
SÉRIE PESQUISAS CIENTÍFICAS – Esta matéria faz parte de uma série de reportagens da Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti), publicadas na Agência Estadual de Notícias, que destacam as pesquisas científicas desenvolvidas por estudantes e professores das sete universidades estaduais do Paraná. Os textos são publicados às quartas-feiras com o selo do Paraná Mais Ciência, um programa estabelecido no Plano Plurianual do Estado (PPA) que viabiliza o fomento científico e tecnológico.
As matérias anteriores apresentaram uma pesquisa da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) sobre aspectos de mudanças climáticas; um estudo da Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP) que analisa indicadores epidemiológicos da saúde de mulheres paranaenses; um dermocosmético com propriedades antibactericida e antifúngicas, desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina (UEL); um medicamento para pacientes com diabetes tipo 2, em desenvolvimento na Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro). Na semana anterior, a série destacou um trator elétrico resultado de uma pesquisa da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste).