Sabado às 07 de Dezembro de 2024 às 04:35:56
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Mais de 121 mil denúncias de bullying foram registradas em 2023 e crime agora é previsto em Código Penal

Dados preocupantes foram registrados ao longo de 2023 no assunto bullying e cyberbullying.

Mais de 121 mil denúncias de bullying foram registradas em 2023 e crime agora é previsto em Código Penal

Dados preocupantes foram registrados ao longo de 2023 no assunto bullying e cyberbullying. Segundo o Colégio Notarial do Brasil, entidade que representa os tabelionatos do país, o número de atas registradas em cartório e que relatam casos de crimes desta natureza chegaram ao alarmante número de 121 mil, superando a marca de 10 mil registros por mês. O número foi considerado um triste recorde, visto que desde 2010, quando os números começaram a serem contabilizados, foram registrados 19 mil casos.

A Folha conversou com a professora Lorena Laskoski, pedagoga, mestre em Psicologia e doutora em Saúde da Criança e do Adolescente, que explicou que muitas pessoas já conseguem entender que bullying não é apenas uma “brincadeira de mau gosto” e sim uma violência. “Ainda há muita informação a ser discutida e desmistificada, pois infelizmente o bullying continua acontecendo e até buscando novos espaços para ocorrer, como é o caso do cyberbullying, sexting e/ou flaming. Todas as escolas devem promover campanhas de conscientização, sensibilização e detecção de bullying, bem como observar, analisar e identificar eventuais praticantes e vítimas.”

Ela explica que caracteriza como bullying o comportamento agressivo e repetitivo que ocorre de forma intencional entre pares, onde uma pessoa ou grupo exerce poder sobre outra pessoa, que não consegue se defender. Pode ser em forma de violência física, verbal, moral, psicológica, material, sexual ou social e tem o objetivo de causar danos, constrangimento, medo ou desconforto à vítima.

Importante ressaltar que desde o início do ano, o bullying e cyberbullying são crimes previstos no Código Penal, com a lei que instituiu a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente e que promove alterações significativas no Código Penal, na Lei dos Crimes Hediondos e no Estatuto da Criança e do Adolescente, criminalizando estes atos. “A Lei 13.185, de 2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática, já prevê a figura do bullying, mas não estabelecia punição específica para esse tipo de conduta, apenas obrigava escolas, clubes e agremiações recreativas a assegurar medidas de conscientização, prevenção, diagnose e combate à violência e à intimidação sistemática”, conforme explica o próprio Senado Federal, por isso crimes desta natureza devem ser denunciados.

Identificando vítimas
A professora doutora explica que dificilmente a criança ou adolescente conseguirá falar para alguém que está sofrendo bullying, pois ele já foi “escolhido” justamente por ser mais introspectivo. “Por isso, é extremamente importante os pais e a escola ficarem atentos aos sinais, pois a vítima pode apresentar: ansiedade, depressão, isolamento, alterações no sono ou apetite, agressividade, falta de interesse nas atividades escolares, queda no desempenho acadêmico, mudanças significativas no comportamento usual, até mesmo automutilação e ideação suicida. Atitudes como não querer ir para a escola, começar a dizer que está com dor de barriga ou dor de cabeça quando está chegando a hora de ir para a aula são sinais de alerta”, enfatiza.

Crianças e adolescentes que apresentam dificuldade de socialização, baixa autoestima, é mais introspectivo/tímido, acabam sendo mais suscetíveis. Já o perfil do agressor, em geral, caracteriza-se por alguém que busca poder ou popularidade, possui comportamento agressivo e com falta de empatia, possuem também comportamentos desafiadores e que, inclusive, apresentam influência da família ou do meio.
“É importante ressaltar que o bullying possui uma tríade, não é somente o agressor e a vítima. Como o agressor busca popularidade, é importante que as ações aconteçam com ‘plateia’, precisa que tenha espectadores, e esses não estão envolvidos diretamente na agressão, mas são coniventes. Muitas vezes assistem passivamente (ou rindo), para que eles não venham a ser a próxima pessoa a sofrer bullying”, diz.

Os prejuízos deixados pelo bullying são muitos e vão desde o baixo desempenho escolar e abandono/infrequência, isolamento social, danos na autoimagem e desempenho social, além de impacto na saúde mental. “Uma criança ou adolescente que sofre bullying apresenta três vezes mais chances de desenvolver transtorno de ansiedade e cinco vezes mais chances de apresentarem depressão, quando comparados aos pares que não sofreram bullying, segundo pesquisas recentes. Além disso, o bullying afeta todo o clima escolar. A escola deve ser um local agradável, de acolhimento para que os estudantes possam se desenvolver bem”, pontua.

Criando ambientes saudáveis
Lorena explica que tanto as escolas, quanto as famílias desempenham papéis fundamentais no processo da cultura pela paz. “As instituições escolares são os locais onde as crianças e os adolescentes passam a maior parte do tempo fora de casa, por isso é importante que seja um local seguro e acolhedor. Tanto a escola quanto a família devem ser modelos de comportamentos respeitosos, inclusivos, promovendo a aceitação da diversidade e rejeitando  qualquer forma de violência, discriminação, preconceito. Ao educar, apoiar e encorajar os alunos a relatarem incidentes de bullying e a valorizarem a diversidade, podemos criar ambientes escolares mais seguros, acolhedores e inclusivos para todos os estudantes. Enquanto pedagoga, eu sempre digo que não conseguimos saber de tudo que se passa com todos os alunos, mas a partir do momento que recebemos uma denúncia iremos apurar, chamar os envolvidos e aplicar o processo restaurativo”, completa.

Acrescenta ainda que muitas vezes são os “terceiros” que fazem o relato, por não estarem envolvidos diretamente, não se sentirem intimidados e não aceitarem tais tipos de violência, por isso que falar abertamente sobre o bullying é importante, uma vez que quem é testemunha pode desempenhar um papel importante ao relatar o incidente às autoridades escolares ou até mesmo para seus pais em casa, e este relatarem a denúncia. “Isso demonstra solidariedade, empatia e responsabilidade coletiva na promoção de um ambiente escolar seguro e inclusivo para todos. Além disso, a escola pode colocar caixinha de denúncia na escola, na qual os alunos poderão fazer a denúncia anonimamente. Já recebi denúncia até por meio das redes sociais da escola. Bullying não é “mimimi”, não é brincadeira de criança e não pode ser normalizado. A sociedade como um todo não pode aceitar que qualquer tipo de violência seja normal. Ir à escola, fazer denúncia em formato de ata. Caso não seja resolvido, procurar outras instâncias, como as Secretarias (Municipal ou Estadual), Conselho Tutelar e até mesmo Delegacia”, finaliza.