“Sensibilidade e tato para atender dezenas de pessoas no momento mais difícil das suas vidas é bastante desafiador”, declara Augusto Mocelin, diretor da Central de Luto
O próximo dia 02 de novembro é Dia de Finados, momento que muitas pessoas separam para relembrar daqueles que já não estão mais entre nós, mas ficarão sempre guardados na memória. São etapas difíceis de serem atravessadas durante a vida, que remetem à separação, despedidas e saudades.
“Embora nós não conheçamos essas pessoas que partiram, nós precisamos conversar e fazer todos os trâmites legais com suas famílias, sentimos e presenciamos a dor delas. Algumas chegam aqui chorando muito, outras revoltadas, há ainda aquelas que estão mais calmas, conformadas com o falecimento, mas sempre é triste, sempre há sofrimento”, descreve o diretor da Central de Luto de Campo Largo, Augusto Mocelin.
Conviver com notícias difíceis diariamente é sempre desafiador e, por isso, Augusto comenta que é preciso saber separar o profissional do particular. “Temos o cuidado de usar a sensibilidade, mas ao mesmo tempo passar força para a família durante nossos atendimentos, sem nos desestabilizar, para que possamos fazer um serviço profissional e eficiente, como ela merece. Nós trabalhamos por escalas, pois a Central de Luto é 24 horas. Quando chegamos em casa, nós temos que ter a destreza de conseguir nos desligar do trabalho para aproveitar a folga”, diz.
Durante a pandemia, a Central de Luto chegou a atender por mês até 280 falecimentos, chegando ao máximo de 300 atendimentos prestados. Vale ressaltar que pela Central de Luto passam todos os óbitos registrados em Campo Largo – inclusive de pessoas de outras cidades, estados ou países – bem como de campo-larguenses que foram transferidos para atendimentos em outros municípios e serão velados ou enterrados na cidade. “Não pode sair nenhum corpo sem ser registrado pela Central de Luto, ainda que tenha falecido em casa, por exemplo, pois precisamos emitir a Guia de Atendimento do Falecido (GAF)”, diz. Atualmente, com a pandemia entrando em uma fase mais branda, o fluxo de atendimentos na Central de Luto caiu cerca de 50%, comenta Augusto.
Mudanças necessárias
Outro desafio foi explicar as mudanças nos velórios e enterros para as famílias já no início da pandemia. “Todos estavam acostumados com velórios de 24 horas acontecendo nas salas da Capela Municipal. Casos suspeitos de Covid-19 o velório diminuiu para duas horas – com caixão fechado -, pessoa com caso confirmado o enterro é direto, pós-Covid (com laudo médico) e mortes causadas por outros fatores são quatro horas de velório, sempre das 6h até 17h. No começo foi mais complicado de entenderem, mas agora já estão mais acostumados. Com velórios acontecendo durante o dia os riscos de assalto são menores, assim como de pessoas em situação de rua adentrando nas salas da capela para pedir alimentos, por exemplo, o que tornou o momento mais intimista para a família”, comenta.
A Central de Luto deixou a Sala 1 da Capela reservada apenas para velórios que aconteceram em decorrência de falecimento por Covid-19, para promover mais segurança às pessoas. A questão de maior peso foi o número máximo de pessoas que podem ficar presentes na sala e a necessidade de chamar a atenção algumas vezes. “Temos que respeitar o número máximo de 10 pessoas por sala, então quando tem muita gente no mesmo ambiente, precisamos pedir para que essa recomendação seja respeitada. É para a própria segurança das pessoas. Algumas vezes há pessoas que respondem, mas acabam atendendo ao chamado”, ressalta.
Uma mudança que chama a atenção neste período de pandemia vivenciado pela cidade foi a necessidade de sinalizar túmulos que estavam recebendo as vítimas de Covid-19. “As pessoas que faleceram por conta do coronavírus não são arrumadas pela funerária, mas são envoltas de plásticos e então colocadas no caixão, que permanece fechado. Nós não sabemos o tempo que levará para que o corpo dela se desintegre, pois a tendência é que ele seja conservado pelo plástico. Então, as gavetas do município que receberam essas vítimas estão sinalizadas com uma sigla e serão abertas somente após termos mais informações a respeito”, comenta.
Atendimentos a pessoas de fora
Augusto relembra que precisou atender situações que envolveram óbitos de pessoas de outros estados e mesmo de outros países. “Um exemplo foi quando a cidade recebeu pessoas vindo do Amazonas. Nós precisamos entrar em contato diretamente com a Anvisa, que passava todos os procedimentos necessários para que a equipe arrumasse a urna e levasse até o aeroporto. Nós temos a nossa permissionária, que recebe o corpo e segue todos esses protocolos. É algo bem mais trabalhoso e leva mais tempo do que a liberação para uma cidade vizinha, por exemplo”, comenta.
O processo de envio de falecido para outro país segue um sistema parecido, porém é uma situação mais difícil de acontecer.
Atribuições da Central de Luto
Cabe à Central de Luto realizar a liberação do corpo, o que acontece após a emissão do Documento de Óbito, para acionar as funerárias – atualmente a cidade conta com cinco permissionárias – que realiza o atendimento à família, que é dirigida à funerária para escolha do caixão. Augusto conta que há um grande número de famílias carentes na cidade que precisam usar os caixões gratuitos e gavetas para o enterro, com prazo de três anos, disponibilizados pelo Município, e que para ser solicitado é necessário comprovação de renda.
Há ainda o chamamento dos pedreiros para a realização do enterro, atualmente são quatro que atuam no município, terceirizados e chamados por vez. E a administração dos cemitérios, que fica responsável por translados, transferências de títulos, reformas de túmulos e limpezas e manutenções gerais.