A seletividade alimentar na infância tem solução, mas é preciso que toda a família seja envolvida no processo
Uma grande dificuldade que muitos pais enfrentam é a seletividade alimentar dos seus filhos, que se estende desde a primeira infância até mesmo à adolescência. Porém, com atenção, paciência e ajuda, há tratamento para reverter a situação.
A nutricionista e especialista em Nutrição Materno Infantil, Marcia Moscatelli de Almeida, explica que a seletividade alimentar é uma dificuldade persistente em comer adequadamente, caracterizada por recusa alimentar, pouco apetite, desinteresse pelo alimento e dificuldade em experimentar novos alimentos. “A alimentação é bem restrita, geralmente a criança come de 11 a 14 alimentos. A recusa de alimentos pode estar associada ao cheiro, gosto, textura, temperatura e/ou aparência. Uma criança com seletividade alimentar pode comer só alimentos brancos, por exemplo, como arroz, macarrão, pão, leite, ou só aceitar alimentos crocantes como as frituras. Em alguns casos a criança pode até selecionar uma determinada marca de alimento.”
Entre as causas possíveis para a seletividade alimentar, Marcia elenca o atraso na introdução de alimentos sólidos durante o primeiro ano de vida ou uma introdução inadequada. Além disso, o comportamento dos pais em relação às dificuldades alimentares das crianças pode gerar conflitos e impactar negativamente na qualidade e quantidade da dieta. A seletividade alimentar não deve ser encarada como uma fase na vida da criança e ao menor sinal de dificuldade alimentar a família deve buscar ajuda profissional.
Falta de apetite, preferências... Como lidar?
De acordo com a especialista, o apetite das crianças é variável e momentâneo, pode mudar de um dia para o outro de acordo com atividade física, temperatura ambiente, ingestão na refeição anterior. Entretanto, uma criança com seletividade alimentar também pode apresentar um apetite diminuído, mas o simples fato de comer pouco não quer dizer que a criança é seletiva, ressalta a nutricionista.
“A falta de apetite ou o apetite diminuído pode estar relacionado a várias causas. Um exemplo é a anorexia fisiológica, que provoca a diminuição do apetite devido à desaceleração no crescimento, sendo mais comum após 01 ano de idade. Além disso, pode compreender causas comportamentais, como a busca por atenção, resposta a alguma alteração na dinâmica familiar, bem como as causas orgânicas, como a dificuldade na mastigação, problemas respiratórios, parasitose, deficiência de zinco e ferro”, esclarece.
Para a falta de apetite, nenhum medicamento ou suplemento deve ser usado sem prescrição. “É importante passar por uma avaliação profissional para investigar as causas da falta de apetite e, inclusive, distinguir se a criança realmente está com o apetite limitado ou se na verdade os pais possuem grande expectativa quanto à alimentação”, completa.
Seguindo a linha, importante a apresentação de uma variedade maior de alimentos para que a criança aumente seu repertório. “A preferência mais comum das crianças é pelos alimentos doces. Isso tem uma explicação, pois nós já nascemos gostando do sabor doce; todos os outros, salgado, amargo, azedo, precisamos ser expostos para aprender a gostar. Por isso não devemos oferecer alimentos doces ou adoçados para a criança antes dos 02 anos de idade. Se a criança for acostumada com preparações com açúcar, poderá ter mais dificuldade em aceitar cereais, verduras e legumes e outros alimentos saudáveis”, diz.
Marcia ensina que a formação do paladar da criança começa ainda durante a gestação. “Depois vem a amamentação e o leite materno também transmite, de uma forma muito sutil, o sabor dos alimentos para o bebê. Por isso quanto mais saudável e variada a alimentação da gestante e da lactante, melhor será a aceitação de novos alimentos a partir dos 06 meses”, recomenda. Quando chega à introdução alimentar, que deve acontecer em tempo oportuno, é necessário ser variada e apresentar evolução da consistência e texturas diversas, orienta. “É preciso ofertar o mesmo alimento de forma contínua e persistente, de oito a dez vezes, no mínimo, preparado de maneiras diferentes. Podemos variar o corte, o tipo de cocção, a receita”, completa.
Hábitos da família influenciam
Como diz o ditado, as crianças aprendem pelo exemplo, e por isso a influência da família é tão forte, passando a construir hábitos alimentares mais saudáveis também nos adultos.
A nutricionista recomenda realizar as refeições em família e ter uma alimentação equilibrada, baseada em “comida de verdade”, incluindo todos os grupos de maneira equilibrada; demonstrar naturalidade e segurança ao provar alimentos junto à criança; dar autonomia para a criança alimentar-se sozinha, sem a coerção do adulto; respeitar os sinais de fome e saciedade da criança; não obrigar a criança a comer tudo o que está no prato e realizar brincadeiras e experiências com os alimentos, isso ajuda a despertar a curiosidade e criar experiências positivas.
“Incluir a participação da criança na preparação dos alimentos é uma excelente estratégia. Com isso estimulamos sua curiosidade pelos aromas, texturas, cores, sabores dos alimentos, criamos experiências positivas, memórias afetivas, e tudo isso contribui para a formação de bons hábitos alimentares”, recomenda.
Deve ser evitado comportamentos por parte da família. Oferecer recompensas, fazer chantagens, subornos, criar punições ou castigos para forçar a criança a comer, não é recomendado. Evitar rotular a criança como ‘chata’, ‘ruim’ ou ‘problemática’ quando recusam alimentos, porque isso pode fragilizar a relação, gerando ansiedade, angústia, culpa”, finaliza.