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Opinião

Quando a carência vem disfarçada é preciso ter cuidado

Quando a carência vem disfarçada é preciso ter cuidado

O assunto da semana acabou sendo a matéria produzida pelo Fantástico, transmitida na Rede Globo, ainda no domingo do dia 08, o qual mostrava uma transsexual que estava presa e foi abraçada pelo renomado médico Drauzio Varella ao tratar sobre o tema solidão. Durante todo aquele tempo que estava reclusa, ela não recebeu visitas de ninguém. Uma comoção em torno da história retratada no programa foi gerada, até mesmo cartas e bombons foram enviados à detenta. Mas a história sempre tem dois lados e o lado do crime cometido foi exposto pela internet. Na verdade, a transsexual foi presa acusada de estupro e morte de uma criança de 09 anos, e membros de sua própria família acabaram depondo contra ela.

Na internet, muita gente se manifestou defendendo o médico, até mesmo falando da própria trans, que já está pagando pelo crime que cometeu. Mas o que ninguém esqueceu foi da mãe da criança, que se mostrou indignada com toda a situação.

Na última terça-feira, o médico divulgou em suas redes sociais um vídeo se desculpando pelos seus atos, para todas as pessoas que ficaram ofendidas com a situação criada na reportagem. Também na data, o Jornal Nacional se desculpou e disse que não tinha conhecimento do crime cometido pela detenta, mas que esperou até ter a certeza dos fatos, do crime cometido em si, para publicar a errata.

Como disse o próprio médico, não estamos aqui para julgar, somos jornalistas e a nossa função é informar a população. Essa situação em si não pode mais ser revertida, mas como tudo na vida serve para nós de lição. A solidariedade é uma das maiores virtudes do ser humano, especialmente do brasileiro que está sempre disposto a ajudar. Naquela matéria foi mostrado somente um fragmento da história da personagem, que também não se preocupou em aparecer em rede nacional. Se existe algo que aprendemos é sempre analisar a história e todo o contexto embutido nela, mas ainda assim é passível de cometermos erros ou de uma publicação ser interpretada de outra forma e sair do controle.

Quando a situação envolve causas sociais, esse cuidado deve receber uma atenção ainda maior. Uma pessoa que peça ajuda sem necessitar de fato é o que basta para colocar em cheque a credibilidade de tantas outras pessoas que realmente precisam de ajuda. Naquela situação, a transsexual estava em uma situação vulnerável, pois se sente abandonada ao cumprir um crime tão chocante para qualquer ser humano, mas retratá-la daquela forma acabou incitando as pessoas a criarem raiva, ódio. Uma escolha errada desde o início, que poderá gerar danos ainda maiores no futuro, quando esta pessoa terminar de cumprir a pena. Com certeza existiam outras personagens, com histórias tão tristes quanto, e que poderiam evitar todo esse problema, caso tudo tivesse ficado às claras. O filtro nem sempre pode ser visto como uma censura, mas às vezes vem para evitar confusão.

Que a solidariedade esteja sempre presente em nossas vidas, pois ser solidário é ser humano, mas que também seja aprendido que é preciso cautela para não acabar sendo mais uma vítima de um recorte da história que está sendo contada por alguém.