Domingo às 24 de Novembro de 2024 às 03:57:10
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Perder um filho: a dor que não tem nome

Ana Paula Batista conta sobre como está, a cada dia, lidando com a morte de seu único filho, Maiko Portela, que faleceu em acidente de trânsito aos 17 anos, no ano passado

Perder um filho: a dor que não tem nome

No próximo sábado (02) é uma data de reflexão e lembrança das pessoas queridas que já não estão mais conosco, pois é Dia de Finados. Para muitos, a data em 2019 terá um sentido ainda maior do que em outros anos, pois acabou perdendo alguma pessoa muito próxima. Perder um filho, por exemplo, é considerada uma situação antinatural, pela qual os pais jamais imaginam passar e é considerada uma das maiores dores ao ser humano por várias correntes de pesquisas na área de Psicologia.

Essa é a dor com a qual convive a mãe de Maicon Portela - ou como ele gostava, Maiko Portela -, Ana Paula Batista, que perdeu o seu único filho há quase um ano em um acidente automobilístico. Ela procurou a Folha para contar um pouco da sua vida após uma perda tão grande. Maiko tinha apenas 17 anos quando faleceu, no dia 25 de novembro de 2018. “Eu tive ele muito nova, quando ainda tinha 15 anos, e no começo fiquei assustada, mas depois, quando ele nasceu, tudo mudou e o amor só cresce a cada dia. Eu sempre quis ter apenas um filho, ele era meu filho único e era mais que um filho, era meu melhor amigo também.

Estávamos sempre juntos
A mãe conta que ele era um menino muito tranquilo e nunca deu trabalho para ela, trabalhava desde os 14 anos, era responsável e independente. “Existem pessoas que quando alguém morre, fica santificando, mas ele era diferente. Todo mundo que o conhecia sabia o quanto ele era bonzinho, amava os animais, era querido e muito empenhado, independente, ia para aula à noite. Lembro que ele acordava 07h30 para fazer café e esperar o meu marido chegar do trabalho. Ele saía trabalhar, ia para a escola à noite, eu buscava ele na escola, e quando chegava em casa ia direto dormir. Às vezes quando eu estava triste, pela manhã, ele chegava na porta do meu quarto e falava ‘vamos levantar, vamos levantar, não quero ver ninguém deitado’. Era muito carinhoso com todos, tanto com a minha família, como com a do pai, que já faleceu há quatro anos”, relembra.

O dia do acidente
Maiko frequentava algumas festas com os amigos, mas a mãe sempre fez questão de ir buscá-lo nos eventos. “Naquela noite eu liguei para ele, passado um pouco da 1h da manhã.

Ele disse que a festa estava muito legal e que não precisava de carona, pois voltaria com os amigos. Mas durante o percurso de volta para casa, a uma quadra da minha casa praticamente, eles capotaram com o veículo e três pessoas faleceram. Eu lembro que às 05h30 eu escutei a ambulância, mas não dei a devida importância, porque é sempre muito movimentado o meu bairro durante o final de semana. Eu vi que ele havia entrado no Whatsapp às 05h25 e pensei que já estivesse em casa e foi bem o horário que o celular parou de funcionar”, conta.

Um tio de Ana Paula ligou para ela 08h30 perguntando sobre o acidente e sobre o Maiko, mas ela respondeu que ele estava em casa. Foi quando o tio dela disse que ele não havia pegado carona com o mesmo menino que tinha ido para o evento. “Eu falei, espera aí que eu vou no quarto. Quando eu abri a porta, estava tudo do mesmo jeitinho que ele havia deixado. Na hora eu percebi que tinha alguma coisa errada. Liguei para os avós dele perguntando se ele teria falado com eles, mas falaram que não. Fui no Batalhão da PM e falei que não conseguia contato com meu filho e que sabia do acidente, mas o policial disse que ele não estava entre as vítimas fatais, mas entre as vivas. Fui em todos os hospitais atrás dele e não achava. Fui na Delegacia e o atendente disse que precisava esperar o pessoal vir do acidente para confirmar. Quando saí de lá, eu disse ‘vamos para o acidente, ver se conseguimos alguma informação’. Eu tinha o nome de outras vítimas, mas o dele não”, relembra.

Na hora que ela chegou ao local, o Instituto Médico Legal estava saindo e embora ela perguntasse para as pessoas que estavam ali, não conseguia nenhuma confirmação.

“Quando eu vi o tênis dele no carro, eu pensei ‘nossa, ele está descalço’, porque você não quer acreditar no pior. Naquele momento eu fiquei sem reação, não queria acreditar no que tinha acontecido. Meu tio olhou para o meu marido e para mim e disse ‘nós temos que arrumar as coisas do Maiko’. Quando ele falou isso, caiu a ficha e o meu mundo também”, suspira.

A mãe foi ao IML, na funerária e organizou todo o velório e enterro do filho. “Depois que tudo passou, eu fiquei 15 dias tomando remédios fortes direto, quando estava passando o efeito, eu tomava de novo. Mudou toda a minha vida, ela era toda planejada em função dele. Eu tinha voltado para a faculdade, estava fazendo Direito e esse era o curso que ele queria fazer também, eu queria dar o melhor para ele sempre.  

Vida após a perda
A mãe montou um álbum com mais de mil fotografias e tem fotos espalhadas pela casa, ainda guarda alguns objetos do filho em casa. A mãe faz acompanhamento com uma psicóloga para tentar amenizar a dor, mas diz que procura não falar muito com as pessoas sobre o filho. Há dias que quer apenas ficar em casa. “Eu sinto às vezes um sentimento de falta muito grande, que chega a dar um desespero até, mas não há como resolver”, descreve. “Eu não sou a vítima, a vítima é meu filho, mas dói muito. Todas as semanas vou até o Cemitério Municipal levar flores. Vai passar 10, 20, 30 ou mais anos e esse sentimento não vai mudar. Eu vou sentir para sempre muito a falta do meu filho”, diz. “Os amigos dele fizeram uma homenagem uma semana depois do falecimento, meu tio comprou alguns balões e nós soltamos, em memória dele. Foi muito bom saber que ele era querido. Eu tenho contato com alguns amigos dele ainda”, conta.

“Uma coisa que eu sempre falo é para aproveitar o máximo seu filho. Às vezes a gente acha que está superprotegendo, mas na verdade não. Tudo o que fizer é importante e ainda será pouco. Se eu voltasse no tempo hoje, faria tudo o que fiz e 10 vezes mais. E para quem tem filhos adolescentes ou jovens, que gostam de ir para festas, levem e busquem eles. São alguns minutos que você perde de sono, mas sabe que ele estará em segurança e, se caso não for possível, saber com quem está indo ou voltando. Eu imagino que ele está bem hoje, mas no luto, morre quem fica, porque todos os dias é um desgaste. Hoje o que eu posso fazer por ele é levar flores. Para os pais que também perderam seus filhos, se tiver mais, sejam parceiros deles, encontre uma distração, eu tenho ela nos meus estudos e isso me ajuda muito. Mas acho que a mensagem principal é ter cuidado no trânsito, não dirigir se tiver bebido, permanecer dentro das leis de trânsito. A gente vê quase todos os dias tantos acidentes, mas por trás deles sempre há uma família chorando”, finaliza.