21-02-201
Na parte da frente da embalagem, em letras garrafais, os benefícios são muitos: leite enriquecido com ômega 3, biscoitos recheados fortificados com ferro e vitaminas, margarina sem gordura trans, pão integral fonte de fibras, leite fermentado com alegações funcionais e maionese com 0% de colesterol. O problema é quando esta propaganda desvia a atenção do consumidor de dados nutricionais pouco saudáveis.
Mas essas "armadilhas" da indústria alimentícia estão com os dias contados. Para deixar os rótulos com informações mais claras e aproximá-los dos consumidores, em março a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável pela aprovação dos alimentos para consumo, deve realizar uma consulta pública para receber novas propostas de critérios para publicação das informações nutricionais complementares nos alimentos. A intenção é verificar como o brasileiro gostaria que elas viessem publicadas para que a leitura e a compreensão fossem mais transparentes. A participação com críticas e sugestões é gratuita e poderá ser feita pelo site www.anvisa.gov.br.
Até a nova regulamentação entrar em vigência, o ideal para o consumidor, segundo os especialistas, é não se deixar levar pela primeira impressão, já que nem sempre aquele produto que aparenta ser mais vantajoso é necessariamente o melhor para a saúde.
"Mesmo com esse destaque na frente dos pacotes, é preciso ler os rótulos com atenção e verificar se um alimento com uma substância de atuação benéfica, como o ômega 3 ou o ferro - expostos em letras grandes -, não é acompanhada de várias outras ruins, como gordura saturada e trans ou sódio em excesso, uma informação que vem em escala bem menor no verso do produto", orienta Durval Ribas Filho, médico nutrólogo e presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran).
Segundo ele, as regras para que uma empresa apresente o produto como funcional, enriquecido ou com baixo teor de algum nutriente são muito criteriosas, mas vale a pena ter atenção e ficar de olho nos produtos que se pretende levar para casa. "Se o produto informa que tem determinada característica, o consumidor pode acreditar, mas isso não tira a importância de comparar as tabelas nutricionais e verificar qual produto é realmente o melhor."
O especialista de Regulação e Vigilância Sanitária da Anvisa Rodrigo Martins explica que alimentos enriquecidos, fortificados ou com baixos teores de algumas substâncias, como gorduras e colesterol, não podem ser, por si só, considerados saudáveis. Isso porque a liberação para o uso de uma dessas denominações é feita apenas pela análise da quantidade de determinado elemento (presença de fibras ou redução no índice de gorduras, por exemplo) e outros aspectos, como ter sódio em excesso, não são levados em conta.
Isso pode ser um problema sério para os consumidores, uma vez que o consumo excessivo de alimentos com fórmulas desequilibradas não ajuda a melhorar a saúde - pelo contrário, pode ser até mais danoso. "Não é porque a empresa diz que o biscoito recheado é fonte de vitaminas que a pessoa deve comer apenas isso. Às vezes, ele é rico em gorduras, sódio, açúcar ou outros componentes que fazem mal à saúde, além de ter muito açúcar", alerta. O resultado são quilos a mais na balança e maior chance de desenvolver problemas graves, como hipertensão, enfarte e diabete.
Frequência
Outro ponto importante é que mesmo os alimentos funcionais com atuação amplamente benéfica para o organismo só conseguem atingir seus resultados se consumidos com frequência. "Não adianta comer aveia uma vez por mês e achar que está protegido contra doenças cardiovasculares", diz a professora da Universidade Positivo (UP) e conselheira do Conselho Regional de Nutricionistas (CRN-PR) Eda Maria Arruda Scur.
Da mesma forma, consumir o pão enriquecido com fibras com margarina rica em ômega 3 e depois extrapolar em refrigerantes e salgadinhos não significa uma alteração positiva em uma dieta desequilibrada. "A ação dos grãos e das substâncias benéficas chega a ser insignificante comparada a esse conjunto alimentar", diz.
Outro ponto importante é saber que os benefícios garantidos por esses alimentos, principalmente os funcionais, são preventivos e não têm a capacidade de curar doenças. "Mesmo com um índice pequeno de ômega 3, o leite enriquecido contribui para manter os níveis de colesterol em dia, mas não substitui a medicação nos casos em que o problema já foi identificado", explica Ribas Filho.
O principal conselho da professora Eda é não cair na ilusão de que o alimento industrializado é capaz de substituir à altura as fontes naturais dos nutrientes. "O leite enriquecido com ômega 3 e os biscoitos fortificados com ferro podem ser mais práticos, mas não substituem o consumo regular de alimentos como salmão e feijão."