Fundado em 1976, pela Federação Espírita Paranaense, o local tem em sua identidade muito da entrega de uma família devota à caridade
“Era uma vez” seria a maneira mais emblemática de iniciar uma longa história de 46 anos de dedicação e amor às crianças da famosa e inicialmente conhecida como Creche Mariinha. História essa dividida entre membros de uma família que tem a bondade, serviço e amor ao próximo como esteio.
Dona Lolari Portugal Caneparo e sua irmã Magali Portugal Sanches foram ao longo destes 46 anos as primeiras responsáveis pelo Cmei e permaneceram como parte integrante da diretoria até 2022, da instituição que atendia até o ano passado 270 crianças, em um espaço com mais de mil e seiscentos metros quadrados de área construída. A partir de 2023, o Cmei Mariinha passou a ser dirigido de maneira integral pela Prefeitura de Campo Largo.
“Criadas na religião espírita, a qual tem como foco a caridade, pois um de seus maiores ensinamentos é ‘fora da caridade não há salvação’, esse ensinamento se fez presente no decorrer de suas existências, e fizeram com que se tornassem pessoas maravilhosas, inclusive tornando-as professoras (...). Em meados de 1976, quando o mundo ainda era em preto e branco, surgiu uma tal de Creche Mariinha. Um local aonde as pessoas que dirigiam e trabalhavam entregando amor. Isso fez o local tornar-se um sucesso, pois quando se trabalha com um propósito não há como dar errado (...) e que logo se tornaria em uma das mais renomadas Creches de Ensino Infantil da região, atendendo quase que na sua totalidade crianças carentes”, descreve o texto oficial da instituição.
O que poucos sabem – ou lembram – é que o local antes abrigou um lar de meninas órfãs ou abandonadas, sendo modificado posteriormente para o formato de creche, conforme solicitação da Federação Espírita do Paraná. Nessa transição, foi necessário mudar móveis, disposição dos ambientes e forma de trabalho. “As meninas tinham entre 10 e 12 anos, e não eram de Campo Largo, por isso a Federação resolveu fechar. Quando modificaram para creche, nós passamos a atender crianças a partir de 01 ano de idade. Lembro que foi fundada em 03 de outubro de 1976, momento em que nos convidaram para fazer parte da diretoria, onde ficamos até o ano passado”, conta dona Lolari.
O início
O perfil de crianças atendidas pela instituição eram aquelas mais carentes – a maioria filhas de mães que trabalhavam em casas de família, como empregadas domésticas ou diaristas, sendo matriculadas em um primeiro momento 30 crianças. À medida que mais crianças foram aparecendo, a equipe de trabalho viu a necessidade de ir aumentando o prédio.
Desde o começo, contaram com auxílio da sociedade civil, que se uniu em prol da construção de um local acolhedor e que permitia as mães trabalharem e deixarem seus filhos sob cuidados de pessoas sérias e comprometidas. Foi realizada então uma corrente, que reuniu “amigos, conhecidos, instituições e empresas”, sendo que ao Município era imputada a responsabilidade do fornecimento de professores. Eram oferecidas, no mínimo, três refeições diárias, sempre completas e com “a famosa sopa no final do dia para que pudessem estar bem alimentadas para voltarem aos seu lares”.
Além disso, era “dado banho nas crianças que necessitavam, e com ajuda do Clube das Mães e do Bazar da Vó, sempre voltavam com roupas ‘novas’ ou seminovas para seus lares”. “O Clube de mães era um grupo de mulheres no Centro Espírita, que partilhavam do mesmo propósito que era “dar amor”. Essas mulheres costuravam roupas para as crianças e também para seus pais, que também eram pessoas carentes e necessitavam de apoio.”
Estrutura e projetos
Andrea Sanches, que ocupou o cargo de diretora da instituição por longos anos, conta que a creche desenvolvia mais de 20 projetos, como o Contando e Encantando, Brasil Pátria Amada, Momento Mágico – que as professoras paravam para ter um momento de leitura individual, Jornal do CEIM, Feira de Ciências, Café dos Pais, Almoço das Mães, além de comemorações em datas especiais como Páscoa, Dia das Crianças, Natal, entre outros.
O local é composto de uma biblioteca com mais de cinco mil livros, sala de computador, aulas de música, dança, pintura, culinária, entre outros ambientes. “Nós tínhamos aqui tudo que uma escola particular oferecia, porém sem o custo, e por isso éramos muito requisitados”, descreve o texto. Questionadas do porquê tamanho sucesso e aceitação da população campo-larguense, as irmãs confirmam que se dá pela tamanha dedicação àquele lugar cheio de felicidade, que até hoje deixa saudades e orgulho ao encontrar gerações de pessoas formadas, mas que deram seus primeiros passos na Creche Mariinha.
A mudança
O último dia 16 de dezembro de 2022 foi marcado pela despedida, tanto do ano letivo que se encerrava, como também desta família dedicada às crianças e à Educação, com um evento de Natal, que reuniu famílias, colaboradores e autoridades. A partir de 2023 toda a administração passou a ser feita pela Prefeitura de Campo Largo, via Secretaria Municipal de Educação.
“A vida é feita de ciclos, para comermos o fruto, temos que adubar, plantar, cuidar e colher, e assim foi com essa instituição. Nós adubamos, plantamos uma semente, fixamos raízes, cuidamos e demos lindos frutos. Como todo ciclo, inclusive o da vida, uma hora se encerra, e infelizmente o da nossa família nesta instituição também encerrou. Encerramos com a certeza que deixamos o melhor fruto que poderia existir, do legado deixado. A caridade e o amor ao próximo estão no nosso DNA, e não iremos deixar de ajudar ninguém, nem parar com o nosso propósito”, completa.
“Conversamos com todo mundo e todo mundo vem falar com a gente, nos param nos comércios, nas ruas. Sentimos falta diariamente deste contato, dessa interação com as crianças e suas famílias. Por isso, não vamos ficar paradas, já temos outro projeto para lançar e ajudar o próximo, que é a grande missão de nossas vidas”, destacam.