Há mais de 70 anos, famílias campo-larguenses com descendência ucraniana realizam suas celebrações dentro das raízes.
Há mais de 70 anos, famílias campo-larguenses com descendência ucraniana realizam suas celebrações dentro das raízes. No início, não como comunidade organizada, mas dentro de suas próprias famílias, com familiares que têm formação dentro de seminários voltados à cultura e celebrações ucranianas.
Anos foram passando, quando em 1997, a família de Lídia Halatiki de Faria veio morar em Campo Largo, mas frequentava a igreja de Ipiranga, em Araucária, e foram se aproximando, inclusive de outras famílias descendentes de ucranianos que vieram viver na cidade. “Começamos a indicar ao padre as famílias, em torno de 15, que recebiam a visita dele. Ele sempre cobrava para que nós nos organizássemos para ter as celebrações, os nossos sacramentos, resgatar nosso rito e nossa cultura.”
Foi quando estava na Paróquia Santa Cecília, no Itaqui, que Lídia ouviu o apelo do padre Gerson Rodrigues Brasil, pároco daquela comunidade, pedindo orações pelo Bispo Dom Efrain, que na época estava muito doente. “Ele falou sobre o carinho que tinha pelos ucranianos. Falei com ele naquele dia, pedindo um espaço para que nós reuníssemos as famílias ucranianas e fizéssemos as celebrações dentro do nosso rito.
Isso foi em janeiro de 2011. Então eu comecei a conversar com os padres, marcamos reuniões, escolhemos a igreja no Vila Glória e no dia 16 de junho de 2011 foi a nossa primeira missa”, relembra Lídia.
Atualmente são em torno de 80 famílias que participam do rito ucraíno na igreja do Vila Glória e pertencem à Comunidade Ucraniana São Miguel Arcanjo. Atualmente, são realizados casamentos, batizados, catequese transliterada – escrita em Português com ensino das principais orações em Ucraniano – além de celebrações especiais como Bênção da Água, da Vela, da Cesta de Alimentos, da Páscoa, Frutos e Sementes, Natal, entre outros.
As receitas típicas de Páscoa e Natal, bem como as tradições ucranianas têm sido reforçadas às gerações. “Muitas famílias estão retornando às suas raízes, pois é algo que acontece quando não se participa de uma comunidade organizada e que mantêm vivas as celebrações. Tem famílias hoje que as crianças estão na catequese, se interessam em saber o idioma e estão participando de todas as celebrações. Esse resgate é muito importante”, comenta Lídia.
Celebrações
Em janeiro acontece a Bênção de Água, então o padre visita todas as famílias a partir de um roteiro. Em fevereiro tem a Bênção de Velas, março tem a Quaresma, abril a Páscoa, maio o Dia das Mães, junho o Sagrado Coração de Jesus, agosto tem do Dia dos Pais, novembro tem o Dia do Padroeiro, que é São Miguel Arcanjo e em dezembro o Natal. “Quase todo mês tem uma celebração em nossa comunidade”, diz Lídia.
São Miguel Arcanjo é o guardião da saúde e da cura física e espiritual, é considerado, também, o chefe da ordem das virtudes. É o padroeiro dos cegos, médicos, sacerdotes e, também, dos viajantes, soldados e escoteiros. Na época foi feita uma pesquisa na comunidade ucraniana sobre qual padroeiro seria adotado e, um dos nomes mais lembrados foi de São Miguel Arcanjo.
A ornamentação do altar segue a igreja ucraniana, com as toalhas bordadas, ícone de São Miguel Arcanjo, os coroinhas e o padre têm uma roupa específica. “É tudo muito colorido, que dá cor e alegria ao ambiente, tudo é muito vivo, com muitas flores, e dá ânimo. Eles gostam de dançar, cantar, é sempre movimento”, relembra Lídia.
“Na igreja ucraniana quando a criança é batizada, ela já é crismada junto. Lá na Ucrânia – como sempre estão em conflito – eles não sabem se a criança irá crescer a tempo de receber este sacramento. Aqui não estamos em conflito, mas a tradição continua. No casamento também, nós fazemos uma coroinha de alecrim que é colocada sob a cabeça dos noivos, o padre com o paramento dele a mão dos noivos sob a Bíblia; a madrinha da noiva cobre ela com um véu e a leva em frente à imagem de Nossa Senhora, consagrando para ser uma boa mãe. No velório é levado o corpo do falecido na igreja, cantado cantos apropriados, depois o padre acompanha até o cemitério e faz a bênção do túmulo. Eles também fazem a Missa de São Gregório, que são 30 dias de missa, com participação da família e com cânticos apropriados”, descreve Lídia.
Diferenças
Lídia explica que a igreja passou por uma reforma nos anos de 1970, quando a igreja latina passou a ter cargos como ministro e diácono, enquanto a igreja ucraniana não tem. “É o padre que celebra a missa, o batizado, a comunhão e eucaristia, os casamentos, e os leigos ajudam. Eu, por exemplo, ajudo na catequese, nas leituras, porém o padre é o celebrante”, explica.
Porém, ambas são católicas. O padre tem uma formação diferenciada, que dura em torno de 12 anos, em um seminário voltado para o rito ucraíno.
Doação do terreno
No dia de Pentecostes do ano de 2017 a comunidade ucraniana recebeu uma doação de um terreno para a construção do templo. “Fomos conhecer o terreno e fomos avisando a todos. Já era um sonho antigo. Esse terreno era da filha de Vicente, que tinha 14 anos e faleceu de meningite. Ele disse que não tinha herdeiro e que precisávamos de um local para a construção da igreja. O terreno fica próximo da região da Campina, em uma área rural. Agora estamos em fase de aprovação do projeto na Prefeitura. Se Deus nos ajudar e São Miguel Arcanjo nos defender, em novembro teremos o lançamento da Pedra Fundamental”, diz Lídia.
Neste processo, apesar de ainda estar no início, muitas famílias estão se envolvendo, mesmo de fora da cidade. Lídia comenta que no futuro, esta igreja, além de ser o templo e marco da fé de dezenas de famílias ucranianas campo-larguenses, deve se tornar um ponto turístico religioso na cidade também.