Não há dúvida que a leitura é um dos hábitos mais saudáveis para a mente de pessoas de todas as faixas etárias e que é mais facilmente introduzido na infância. A pesquisa Retratos da Leit
Não há dúvida que a leitura é um dos hábitos mais saudáveis para a mente de pessoas de todas as faixas etárias e que é mais facilmente introduzido na infância. A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro mostrou que o brasileiro lê em média 2,43 livros por ano, e 30% nunca compraram um livro.
A professora de Língua Portuguesa, especialista em Literatura Brasileira e mestranda em Estudos de Linguagem, Angela Fernandes, explica que é a partir da literatura que a criança é levada a desenvolver a imaginação, emoções e sentimentos de forma prazerosa e significativa, contribuindo assim para o seu desenvolvimento social, emocional e cognitivo. “A literatura deve fazer parte da rotina da família, uma vez que desenvolver o interesse e o hábito pela leitura é um processo constante, que começa muito cedo, em casa, aperfeiçoa-se na escola e continua pela vida inteira. A criança que houve histórias desde cedo, que tem contato direto com livros e que seja estimulada, terá um desenvolvimento favorável ao seu vocabulário, bem como a prontidão para a leitura.”
De acordo com a professora, a leitura começa mesmo antes da alfabelização, período o qual os pais são as peças-chave no quesito incentivo. Algumas iniciativas como procurar livros adequados à idade, com figuras coloridas e menos texto para os menores, e o contrário para os maiores é uma ferramenta. Outros comportamentos bastantes positivos segundo a professora são as visitas às bibliotecas e livrarias, além dos exercícios de desenho e pinturas ou fazer a própria criança contar a história.
“A escolha mais adequada depende da idade e do interesse da criança. Eu costumo dizer que toda leitura é válida e que todo autor pode contribuir significativamente com algum aspecto na formação de leitores. Existem, porém, aqueles cuja leitura é mais valorizada por apresentarem mais características literárias, por exemplo Ana Maria Machado, Sylvia Orthof, Eva Furnari, Ziraldo, Angela Lago”, diz.
Histórias em Quadrinhos
Para a professora, as Histórias em Quadrinhos, popularmente chamados de gibis ou HQ, podem estimular os leitores a buscarem outros tipos de leitura. “Este tipo de ‘literatura’ muito contribui para a formação de leitores competentes, pois sua linguagem (ação narrativa) empolga e satisfaz as crianças e adolescentes (no caso dos mangás), não cansa, como acontece muitas vezes nas leituras obrigatórias e, ao adaptar-se ao seu nível intelectual e ao seu interesse, rompe as barreiras que existem contra a prática de leitura, sendo um eficiente instrumento para despertar o gosto por ela”, explica.
Angela diz ainda que esse estilo de leitura faz com que a criança envolva-se em uma “atividade solitária e não movimentada por determinado período de tempo, que são características pouco frequentes nas atividades de crianças pré-escolares ou no início da escolarização”.
Adolescente que não lê
Introduzir o gosto pela leitura em adolescentes é um tanto complicado, pois suas preferências já estão formadas e são mais difíceis de serem mudadas. Entretanto, a professora orienta a trabalhar com a leitura nos dispositivos digitais, que são os queridinhos dos adolescentes. “É possível explorar poemas visuais por exemplo, jogos que constróem narrativas (como os de RPG) e principalmente na escola temos que mudar a maneira como ofertamos a leitura aos alunos. No mundo em que vivemos, o livro físico não é a única possibilidade, nem a mais utilizada. É preciso mostrar aos jovens e adolescentes a maneira de tornar a tecnologia nossa aliada, inclusive nas atividades de leitura”, aconselha.
Para pais de adolescentes que gostam da leitura, segundo ela, precisam entender que comprar livros são investimentos, e também orientar, respeitar os adolescentes a buscarem títulos que gostam e que estão dentro do orçamento da família.
Livro x filme
Uma ferramenta atraente são os livros que viraram filmes. Tanto a leitura do livro para então assistir o filme, como o contrário, são válidas, mas a professora ressalta que a literatura daquela história acaba sendo mais envolvente do que o filme. “Eu, particularmente, prefiro ler o livro primeiro. Por quê? Bem, porque eu gosto de imaginar os meus próprios personagens. Gosto de imaginar cada um de acordo com as características que o autor cita ou com a minha própria imaginação somente. E quando se vê o filme primeiro, a imagem que fica na cabeça é a dos atores do filme. Por mais que você tente depois imaginá-los, eles sempre se parecerão com os atores do filme, já que aquela imagem ficou ‘impregnada’ na sua mente”, opina.
Sentido Figurado
Ainda em setembro, circulou pelo Whatsapp e Facebook um trecho do livro “O menino que espiava pra dentro”, da Global Editora, escrito em 1983, pela renomada escritora e acadêmica da Academia Brasileira de Letras, Ana Maria Machado. Algumas pessoas acusaram a obra de incentivar o suicídio entre as crianças, por meio do sufocamento. “Partilho da opinião de diversos estudiosos da literatura infanto-juvenil ao alertarem que muitos dos pais que enxergam tantos monstros nos livros infantis são os mesmos que deixam seus filhos expostos aos desenhos, novelas, noticiários, canais do YouTube e jogos – com conteúdos totalmente inadequados e que, diferentemente dos textos literários, não apresentam um potencial de fruição e apelo à construção de mundos simbólicos. Os adultos precisam acreditar na inteligência das crianças. Elas são capazes, sim, de ler e compreender textos com nossa ajuda. Elas podem, sim, chegar a descobertas que ainda não fizemos. Elas podem ir muito além. Não quero dizer com isso que devemos deixá-los sozinhos à sua própria sorte. Ler junto, estar junto, brincar junto, aprender junto, viver junto. É isso que elas pedem. E não ler por, brincar por, aprender por ou viver por elas”, ressalta.
“A literatura em sua essência não se propõe a ter finalidade educativa, obras literárias não devem ser compreendidas como obras didáticas, que pretendem ensinar alguma coisa. Em um livro de histórias, a narrativa impera e não há intenção de se ensinar qualquer coisa que seja. Bons livros nos levam a boas reflexões. Contudo, se mesmo assim a família considerar o texto arriscado, não há problemas, basta não o incluir em seu acervo. Mas é necessário abrir-se para a possibilidade de outras pessoas interpretarem de maneira diferente”, finaliza.